terça-feira, 10 de novembro de 2009

"Piaf - Um Hino ao Amor"

A vida de Edith Piaf foi tão gloriosa quanto trágica. O sucesso marcou a sua vida tanto quanto à tragédia. E “Piaf – Um Hino ao Amor” (La Môme, 2007) deixa tudo isto bem claro. O diretor Olivier Dahan conta a história da grande cantora francesa Edith Piaf de maneira brilhante. A emoção e o drama aparecem na medida exata para narrar uma vida de desgraças e alegrias. O filme é dividido em três narrativas: a infância de Piaf, o sucesso e o auge da fama e, por fim, a doença. O recurso de ir e voltar no tempo, durante toda a projeção, pode confundir um pouco o espectador, mas este se torna apenas um detalhe diante de uma obra tão envolvente e emocionante. “Piaf – Um Hino ao Amor” é sentimento puro. Parece impossível se manter alheio a toda aquela carga de emoções que é jogada na tela. A trilha sonora baseada na carreira de Piaf também é fantástica. Há um casamento perfeito entre as cenas e as músicas escolhidas. E o longa de Dahan tem seu maior trunfo na interpretação de Marion Cotillard. É ela a responsável pela grandiosidade desta obra. A presença da atriz em cena é arrebatadora e sua performance hipnotiza o espectador. A caracterização de Cotillard como Edith Piaf é espantosa e lhe garantiu o Oscar de Melhor Atriz, assim como outros tantos prêmios recebidos pela sua atuação. “Piaf – Um Hino ao Amor” começa em 1959, quando Edith Piaf (Marion Cotillard) já é uma estrela da música, mas logo em seguida volta no tempo. O filme mostra Edith (Manon Chevallier) criança, vivendo num bairro pobre de Paris. Filha de uma cantora de rua, Anetta (Clotilde Courau), com um contorcionista de circo, Louis Gassion, (Jean-Paul Rouve), a garota perambula pelas ruas e passa grandes dificuldades. Edith, então, é levada para morar com sua avó (Sylvie Testud), dona de um bordel. Ela passa a viver em meio às prostitutas e a agitação que acontecia no local durante as noites. Uma das mulheres que trabalhava no bordel, Titine (Emmanuelle Seigner), rapidamente cria afeição por Edith. Quando a menina é diagnosticada com uma rara infecção na retina que a deixa temporariamente cega, é Titine quem a leva ao túmulo de Santa Terezinha. O objetivo delas é entregar flores à imagem e pedir que Santa Terezinha lhe conceda a graça de voltar a enxergar. Rapidamente, Edith recupera a visão. A garota vive com a avó e as meretrizes até o dia em que seu pai volta para lhe buscar. Titine tenta impedir que Louis a leve, mas não consegue evitar a partida. Edith (Pauline Burlet), agora com 10 anos, acompanha o pai em suas apresentações de rua. Em uma delas, quando as pessoas pedem para que a garota também faça um número, seu pai a chama e a obriga a apresentar algo. Em seguida Edith solta a voz e encanta todo mundo que passava pela rua. A menina cresce e passa a batalhar efetivamente por uma carreira como cantora. Encarando muitas dificuldades em função da sua própria miséria, Edith percorre as ruas, se apresentando lá e cá, em busca de algum trocado. Sempre acompanhada de sua fiel amiga, Mômone (Sylvie Testud). Até o dia em que, casualmente, seu destino cruza o caminho de um empresário da noite parisiense, chamado Louis Leplée (Gerárd Depardieu). Ele fica impressionado com o talento de Edith e a convida para se apresentar em sua boate. Daí para frente, a carreira de Piaf deslancha. Ela se torna uma das principais referências da cultura francesa e se torna conhecida mundialmente. Mas em meio ao sucesso, muitas tragédias marcam a vida de Edith. Ao longo de sua trajetória, a cantora é acusada de participar do assassinato de Leplée, escapa da morte num violento acidente de carro, perde sua filha vítima de meningite e perde também seu grande amor, Marcel Cerdan (Jean-Pierre Martins), em um desastre de avião, após chamá-lo para encontrá-la em Nova York. Sem contar os seus problemas com o alcoolismo e drogas. Sua desgraça derradeira veio com a enfermidade pela qual foi acometida no final da década de 50. Seus últimos anos foram de reclusão até o dia de sua morte, aos 47 anos, em 1963. E “Piaf – Um Hino ao Amor” termina com a estrela francesa interpretando uma de suas canções mais conhecidas, “Non, Je ne Regrette Rien”, no Olympia. Ali é anunciada a sua despedida. Ali terminava um tempo de glórias e infelicidades. A vida pode ter sido cruel e maravilhosa ao mesmo tempo, mas acima de tudo, Edith Piaf não se arrependia de nada.


Por Gabriel Von Borell





Piaf – Um Hino ao Amor
(La Môme, França, Reino Unido, Republica Checa, 2007)
Direção: Olivier Dahan Roteiro: Isabelle Sobelman e Olivier Dahan Elenco: Marion Cotillard, Sylvie Testud, Gérard Depardieu, Emmanuelle Seigner
. Drama. 140 min.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

"Dançando no Escuro"

“Dançando no Escuro” (Dancer in the Dark, 2000) é a obra-prima do diretor dinamarquês Lars Von Trier. O filme vencedor da Palma de Ouro em Cannes no ano de 2001 é um musical antiilusionista profundamente triste e que deve ser conferido por todos os amantes da sétima arte. Mesmo que seja para chorar rios de lágrimas. O longa de Lars Von Trier ainda valeu o prêmio de melhor atriz, também no Festival de Cannes, para Bjork, por sua brilhante atuação. “Dançando no Escuro” retrata uma realidade dura e cruel, em que a tragédia da personagem principal atinge níveis estratosféricos. Quem procura o filme pensando em assistir um musical bonitinho e feliz vai se decepcionar. A história da personagem de Bjork é difícil de ser digerida e não existe a menor possibilidade do espectador não lidar com sentimentos ruins como raiva, desprezo e revolta. O filme do diretor de “Dogville” (Dogville, 2003) em nenhum momento resvala no estilo “dramalhão” embora seja extremamente emocional. Com a câmera na mão, Lars Von Trier trabalha com closes generosos que valorizam a performance do elenco e a expressão no rosto de cada um dos atores durante os diálogos mais dramáticos. O resultado em cena é excelente e aproxima o espectador da ação, fazendo com que o sofrimento da protagonista seja sentido completamente pelo público. As cores frias e pálidas também reforçam a crueldade da trama. Mas nem tudo em “Dançando no Escuro” é pesado e trágico. A maravilhosa trilha sonora e os números musicais dão o tom de fantasia e ilusão em meio a tanta desgraça. Selma (Bjork) é uma imigrante da Checoslováquia que vive nos Estados Unidos e trabalha dia e noite em uma fábrica para conseguir pagar uma cirurgia para seu filho, Gene (Vladan Kostig). Sem vaidade alguma, ela sofre de uma doença hereditária que está comprometendo sua visão e em pouco tempo a deixará completamente cega. Selma sabe que seu filho irá passar pelo mesmo problema e ela precisa juntar o restante do dinheiro para a operação de Gene. Sendo assim, a imigrante entra numa rotina de trabalho ainda mais exaustiva visando financiar a cirurgia. A imigrante chega a pegar no batente mesmo quando não está enxergando mais um palmo a sua frente. Contando com a ajuda de seus vizinhos, Linda (Cara Seymour) e Bill (David Morse), Selma leva a vida com muitas dificuldades. Sua única válvula de escape é a música, que a faz criar seu próprio universo de sonhos e superar os desafios de uma vida cruel e injusta. Selma é apaixonada pelos musicais de Hollywood e seu refúgio reside na fantasia que eles possibilitam à sua imaginação. O ritmo e barulho das máquinas fazem a moça lembrar destas produções musicais e assim Selma dá asas a sua criatividade. Ela constrói devaneios que tornam suas longas horas de trabalho na fábrica um pouco mais suportáveis. Os números de música em “Dançando no Escuro” são frutos da imaginação da personagem de Bjork e são intercalados com a narrativa principal. Selma brilha em grandiosas cenas idealizadas pela sua mente e é onde ela se torna uma grande estrela. Quando Selma começa a se atrapalhar na fábrica por causa da cegueira, nem mesmo sua fiel companheira de trabalho, Kathy (Catherine Deneuve), consegue evitar sua demissão. Selma ainda é obrigada a desistir do papel principal em uma peça de teatro por causa da sua condição. Mas nada é tão ruim que não possa piorar. Seu vizinho Bill está passando por enormes dificuldades financeiras e, com medo de contar a sua mulher, pede para que Selma lhe empreste o dinheiro que ela juntou para a cirurgia de Gene. Diante da negativa da imigrante, que explica que não pode mexer no montante, Bill acaba descobrindo onde Selma guarda o dinheiro e rouba todas as economias da mulher. Quando Selma descobre o que Bill fez ela vai até sua casa para tomar de volta o que é seu. Chegando lá, Selma descobre, através de Linda, que seu vizinho está a acusando de assédio e, quando a imigrante sobe para conversar, Bill ainda faz parecer que Selma estaria querendo roubar o dinheiro que na verdade ele tirou dela. Tendo que lutar, mesmo cega, para reaver a quantia que juntou durante uma vida inteira de trabalho, Selma é obrigada a matar Bill. Sendo procurada pela polícia, ela é presa por homicídio e levada a julgamento. Selma abdica da chance de se defender no tribunal para proteger a verdade sobre a doença do seu filho. O fato de Gene descobrir o seu problema poderia complicar seu tratamento, já que o aspecto psicológico pode acelerar o desenvolvimento da doença. E se Gene continuar sem saber de seu histórico familiar as chances do garoto enxergar durante toda a sua vida são bem maiores. Então, Selma mente em diversos momentos de seu julgamento mesmo que isso custe sua própria vida. E o resultado não poderia ser mais desesperador. A imigrante checa recebe a sentença de morte e somente lhe resta esperar por seus últimos dias de vida. Mas quando todo mundo fica sabendo sobre a doença de Gene, o destino coloca em suas mãos a chance de escapar do enforcamento. Tudo parece se encaminhar para um final feliz até o momento em que Selma descobre que o dinheiro que seria usado pra lhe tirar da prisão era o mesmo que pagaria a cirurgia de Gene. Kathy tenta persuadir Selma, que não aceita que o dinheiro de Gene seja gasto com outra coisa que não seja a operação. O espectador inevitavelmente torce desesperadamente por Selma, embora no fundo tenha a certeza de que aquilo ali não vai acabar bem. E de fato ele tem razão. “Dançando no Escuro” é demasiadamente triste durante toda a projeção e assim teria de ser seu desfecho. A quem assiste resta lidar com uma enorme angústia na alma. Os passos de Selma, em ritmo de música, a caminho da sua desgraça final anunciam que a “última canção” está por vir. Mas como diria Selma, “só será a última canção se deixarmos que seja”.


Por Gabriel Von Borell





Dançando no Escuro
(Dancer in the Dark, Dinamarca, Alemanha, Islândia, 2000)
Direção: Lars Von Trier Roteiro: Lars Von Trier Elenco: Björk, Catherine Deneuve, David Morse, Peter Stormare
. Drama. 140 min.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

"À Prova de Morte"

A segunda parte do projeto cinematográfico chamado “Grindhouse”, idealizado pelos cineastas Robert Rodriguez e Quentin Tarantino, é ainda melhor que a primeira. Coube a Tarantino fazer a parte final do projeto, que ganhou o nome de “À Prova de Morte” (Death Proof, 2007). Já a primeira metade ficou para Rodriguez, que realizou seu “Planeta Terror” (Planet Terror, 2007). A intenção dos cineastas era homenagear os filmes do estilo “exploitation”, muito populares durante a década de 70, que consiste na mistura de sexo e violência de uma forma bem sensacionalista para atrair o público. As características que marcavam esse tipo de produção era a falta de comprometimento com a qualidade técnica e artística e seu baixo orçamento. Grindhouse era o termo usado nos Estados Unidos para designar as salas de cinema onde estes filmes eram colocados em cartaz. Na maioria das vezes, eles eram exibidos em sessões duplas. O espectador pagava somente um ingresso e podia assistir a dois filmes. Fãs confessos do cinema trash, surgiu daí a idéia de Robert Rodriguez e Quentin Tarantino em lançarem seus filmes no formato 2 em 1. E o diretor de “Pulp Fiction” e “Kill Bill” prova seu enorme talento, mais uma vez, em “À Prova de Morte". Tarantino parece ser realmente um mestre na arte de transformar projetos de gosto duvidoso em cinema de primeira qualidade. Com muitas referências à cultura pop, o que já se tornou uma marca registrada do diretor, e também à clássicos de cinema do gênero, “À Prova de Morte” é um suspense trash delicioso de ser assistido. E sensual também. O diretor valoriza as formas femininas por diversas vezes, mas sem cair na vulgaridade. Como por exemplo, quando uma das belas jovens que aparecem no filme dança para um Kurt Russell psicopata. Aliás, o ator está ótimo em cena como o serial killer de estrada e canastrão na medida perfeita. E os diálogos de Tarantino estão mais afiados do que nunca. É maravilhosa a cena em que quatro personagens femininas conversam em uma mesa e a câmera, sem cortes, gira em torno delas por dez minutos ininterruptos e o espectador acompanha aquele longo papo sem ficar entediado. A trilha sonora é outro ponto muito positivo e reforça a competência de Tarantino para compor a parte musical de seus filmes. O diretor também assina a direção de fotografia. E como não poderia ser diferente, “À Prova de Morte”, assim como acontece em “Planeta Terror”, ainda traz Tarantino fazendo uma ponta bem humorada como um barman local. A história começa com três jovens garotas se preparando para uma viagem de carro. Jungle Julia (Sidney Tamiia Poitier) é a sensual e ousada DJ da rádio da cidade. Ela parece liderar o grupo. Shanna (Jordan Ladd) faz o tipo mais ingênuo e infantil. Já Arlene (Vanessa Ferlito) é observadora e discreta. A viagem das três deveria ser maravilhosa senão fosse pela aparição de Dublê Mike (Kurt Russell), um maníaco assassino que sente prazer em perseguir e matar mulheres com seu carro preto “à prova de morte”. As jovens vão parar num pequeno bar e lá aparece Dublê Mike para observar suas futuras vítimas. Mas quem acaba morrendo primeiro é Pam (Rose McGowan). A protagonista de “Planeta Terror” aqui aparece numa participação especialíssima. Pam aceita uma carona do serial killer e Dublê Mike lhe mostra seu carro assassino antes de correr atrás de Jungle Julia e Cia. Mas logo depois de “eliminar” Pam, o psicopata avista o carro das moçoilas na estrada e causa uma batida violenta ao extremo. O diretor mostra exatamente como as garotas morrem fazendo vários replays em câmera lenta com o impacto da batida e os corpos de cada uma delas sendo, literalmente, despedaçados no ar. Neste momento do longa, quatorze meses se passam e surge agora na tela outro grupo de jovens mulheres se aventurando numa viagem de carro. Abernathy (Rosario Dawson) é maquiadora. Kim (Tracie Thoms) é dublê de cinema e Lee (Mary Elizabeth Winstead) é atriz. As três estão trabalhando num set de filmagem e vão encontrar uma quarta amiga chamada Zoe (Zoe Bell, que interpreta a si mesma). E é claro que Dublê Mike vai cruzar também o caminho do grupo. Só que as coisas não saem bem como foi planejado pelo serial killer. Zoe está na cidade para procurar pelo dono de um antigo carro. O homem está querendo vender seu automóvel e ela está doida para ser a compradora. Só que antes, ela quer fazer um perigoso test-drive na estrada. Zoe recruta suas amigas para lhe auxiliarem na tarefa de reproduzir uma cena do filme “Corrida Contra o Destino”, em que este mesmo carro aparece. Na cena, um personagem se deita sobre o capô do carro em alta velocidade. É quando “A Prova de Morte” nos apresenta uma sequência de perseguição incrível que promete entrar para a história do cinema. O problema é que Dublê Mike surge no exato momento em que o grupo de amigas está tentando realizar tal proeza. O assassino quer a todo custo derrubar Zoe de cima do capô e as jovens se empenham em conseguir se livrarem daquela perigosa situação. O fato da atriz Zoe Bell na vida real ser também dublê de corpo imprime um realismo impressionante em cena. Para infelicidade de Dublê Mike ele parece ter escolhido as vítimas erradas. E “À Prova de Morte” chega ao final com um desfecho inesperado e cool, capaz de animar o mais desanimado dos espectadores. Um fim com a cara de Quentin Tarantino. No final das contas, “À Prova de Morte” supera a primeira parte de “Grindhouse”, “Planeta Terror”. Embora o filme de Robert Rodriguez seja deveras divertido não consegue atingir a excelência que Tarantino confere à sua obra.


Por Gabriel Von Borell


Para ler a resenha sobre a primeira parte de “Grindhouse”, acesse "Planeta Terror"




À Prova de Morte
(Death Proof, Estados Unidos, 2007)
Direção: Quentin Tarantino Roteiro: Quentin Tarantino Elenco: Kurt Russell, Rosario Dawson, Rose McGowan, Vanessa Ferlito
. Ação. 114 min.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

"O Leitor"

O diretor de “As Horas” (The Hours, 2002), Stephen Daldry, realiza mais um belo filme com “O Leitor” (The Reader, 2008). O longa é uma envolvente trama sobre medo, transmissão de culpa e as conseqüências que os nossos segredos podem trazer. Até que ponto vale a pena omitir um fato para proteger uma verdade inconveniente? Baseado no romance homônimo e sucesso mundial, de Bernhard Schlink, “O Leitor” disseca polêmicas, julga a conivência dos alemães com crimes de guerra e analisa a ética do ser humano. Com uma esplêndida atuação de Kate Winslet, que ganhou o Oscar de Melhor Atriz e o Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante, o filme de Stephen Daldry é um dos mais memoráveis da história recente do cinema. Winslet dá vida a uma personagem extremamente complexa que somente uma grande atriz seria capaz de desempenhar. O excelente roteiro de David Hare também é peça fundamental para a qualidade de “O Leitor”. A história tem início na Alemanha em 1995, onde Michael Berg (Ralph Fiennes) prepara seu café da manhã. Neste momento aparece Brigitte (Jeanette Hahn), que passou a noite com ele. O espectador logo percebe a personalidade excêntrica de Michael. Sua filha, Júlia (Hannah Heurzsprung), por exemplo, reclama que não conhece nada sobre a vida do pai. É quando os flashbacks começam a surgir em tela, que por sinal são perfeitamente inseridos. Agora Michael aparece com apenas 15 anos (interpretado pelo novato e talentoso David Kross). O ano é 1958. O jovem sente-se mal ao voltar para casa e, debaixo de chuva, pára em frente a um prédio antigo. Ali, ele é ajudado por uma mulher chamada Hanna Schmitz (Kate Winslet). De volta à sua casa, Michael conta aos pais sobre o ocorrido. Em seguida, ele é diagnosticado com escarlatina. Seus pais, com medo do perigo de contágio, o isola dos irmãos e Michael passa um longo período de repouso e afastado da escola. Recuperado da doença, o jovem retorna à casa de Hanna para lhe entregar algumas flores como forma de agradecimento. É o início de uma tórrida relação entre os dois e marca a iniciaçao sexual de Michael. Hanna só faz uma exigência antes do sexo: que o garoto leia para ela. Apesar da reclusão e dos modos grosseiros de Hanna, Michael começa a se apaixonar por ela. A alemã, cobradora de bonde, fica fascinada com os textos lidos por Michael, como “A Odisséia”, de Homero, e “A Dama do Cachorrinho”, de Tchékhov. As histórias, muitas vezes, a faz chegar às lágrimas. E, assim, em nenhum momento Michael poderia supor que aquela mulher de aparência triste e inofensiva fosse capaz de cometer terríveis atos, como ele descobriria anos mais tarde. Porém, Hanna desaparece de uma hora para a outra sem deixar pistas e o romance dos dois acaba durando somente um verão. Michael fica desolado e cresce atormentado por esta perda. Ele se torna um homem incapaz de estabelecer vínculos com as pessoas. Anos se passam e Michael está na faculdade de Direito. Sob a orientação de um professor, ele e alguns colegas vão acompanhar o julgamento de ex-oficiais mulheres que respondem por crimes de guerra durante o nazismo. O que Michael não esperava é encontrar Hanna no banco dos réus. Ela e mais cinco mulheres são acusadas de serem responsáveis pela morte de milhares de prisioneiras judias. O reencontro é extremamente chocante para Michael. Sem coragem de aparecer em sua frente, o estudante acompanha o julgamento de longe. Quando surge a oportunidade de abrandar a sua delicada situação no caso, Hanna oculta uma informação que poderia mudar os rumos do julgamento. Ela toma tal atitude a fim de proteger um segredo que é somente seu. Atento a todos os detalhes, Michael se dá conta da verdade que Hanna está tentando omitir e entra num dilema particular. Michael deveria intervir no caso sabendo que tem nas mãos um detalhe que poderia, ao menos, aliviar a pena de Hanna? Ou não deveria fazer nada já que tem plena consciência de que ela própria não gostaria de ter seu segredo revelado, mesmo que isto significasse a possibilidade de Hanna passar o resto da sua vida atrás das grades. Hanna então acaba condenada a prisão perpétua. Michael jamais a esquece e transforma a vida de Hanna, ainda que de longe, de uma maneira que ela jamais poderia imaginar. Seu gesto prova que, pelo menos, a absolvição de Michael ela tem. Anos depois, quando Hanna está prestes a sair da cadeia e bem idosa, eles têm finalmente seu reencontro. O distanciamento e a mágoa de Michael dão um tom formal à conversa. Michael arranja um local para Hanna ficar, mas ela prevê um final diferente para si. Michael então descobre que sua intenção nunca foi a de deixar a prisão. Ele é incumbido por Hanna Schmitz de uma missão especial. Michael vai até a casa de uma sobrevivente de Auschwitz e conta o segredo de Hanna para a mulher. A ex-prisioneira não aceita a história como uma explicação ou desculpa. Michael então deixa com a moça todas as economias de Hanna, uma forma que a alemã encontrou de diminuir todo o sofrimento que causou. A mulher só aceita a quantia para fazer qualquer doação que não tenha ligação com os crimes de nazismo, já que soaria como algum tipo de compensação. “O Leitor” é um filme que questiona os sentidos da verdade e faz o espectador refletir sobre a relação entre o perdão e culpa.



Por Gabriel Von Borell




ficha técnica:
título original:The Reader
gênero:Drama
duração:02 hs 04 min
ano de lançamento:2008
site oficial:http://www.thereader-movie.com/
estúdio:The Weinstein Company / Neunte Babelsberg Film / Mirage Enterprises
distribuidora:The Weinstein Company / Imagem Filmes
direção: Stephen Daldry
roteiro:David Hare, baseado em livro de Bernhard Schlink
produção:Donna Gigliotti, Anthony Minghella, Redmond Morris e Sydney Pollack
música:Nico Muhly
fotografia:Roger Deakins e Chris Menges
direção de arte:Christian M. Goldbeck e Erwin Prib
figurino:Donna Maloney e Ann Roth
edição:Claire Simpson
efeitos especiais:RhinoFX / Custom Film Effects

elenco:
Ralph Fiennes (Michael Berg)
David Kross (Michael Berg - jovem)
Jeanette Hain (Brigitte)
Kate Winslet (Hanna Schmitz)
Susanne Lothar (Carla Berg)
Alissa Wilms (Emily Berg)
Florian Bartholomäi (Thomas Berg)
Friederike Becht (Angela Berg)
Matthias Habich (Peter Berg)
Bruno Ganz (Prof. Rohl)
Max Mauff (Rudolf)
Karoline Herfurth (Marthe)
Lena Olin (Rose Mather / Ilana Mather)
Alexandra Maria Lara (Ilana Mather - jovem)
Frieder Venus (Médico)

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

"A Troca"

Clint Eastwood é um dos maiores diretores de cinema do mundo e tem provado isto com uma carreira bastante sólida e bem sucedida. A partir desta constatação, “A Troca” (Changeling, 2008) entra para a categoria de suas melhores realizações, se não a melhor. O drama, baseado em uma história real, da mulher que encara o sumiço de um filho e depois luta para provar que a criança que recebeu de volta é outra, é perfeito tanto nos aspectos técnicos como nos artísticos. A qualidade que Eastwood consegue imprimir aos seus filmes é impressionante. E como não bastasse todo seu talento atrás das câmeras, o espectador assiste a um verdadeiro show de Angelina Jolie, numa atuação realmente sensível e inspirada e que lhe rendeu uma indicação ao Oscar. A condução clássica de narrativa que tanto marca os longas de Eastwood está ainda mais forte, e melhor, em “A Troca”. O cineasta dirige sua trama com extremo cuidado e nos apresenta uma fotografia belíssima com planos escuros. As tomadas em que os lábios vermelhos de Jolie contrastam com seu semblante enegrecido são incríveis. A direção de arte e os cenários de “A Troca” também estão formidáveis. O roteiro assinado por J. Michael Straczynski é fabuloso e escapa ileso das armadilhas que poderiam transformar o filme num dramalhão descomedido. Nas mãos de Clint Eastwood esse risco é reduzido para zero. “A Troca” conta a história de Christine Collins (Angelina Jolie), uma mãe solteira, nos anos 20, que um dia sai para trabalhar e quando retorna para casa não encontra seu filho, Walter (Gattlin Griffith). Imediatamente, Christine liga para polícia, que por sua vez avisa que nada pode fazer antes que se completem 24 horas desde o momento em que o menino sumiu. O policial que atende a ligação tenta tranqüilizar Christine dizendo que na maioria das vezes as crianças retornam poucas horas depois, mas ela sente que algo muito terrível pode ter acontecido. O Departamento de Polícia de Los Angeles não inspira confiança já que está mergulhado em escândalos envolvendo corrupção e abusos de poder. Diante disso, a polícia enxerga no caso de Walter uma oportunidade perfeita para limpar a sua barra com a população, além de levantar a moral da instituição e posar de eficiente para a imprensa. Só que a tentativa de solucionar o problema a qualquer custo culmina num grande erro. Alguns meses depois, Christine é avisada que haviam encontrado seu filho, ela então vai até a estação de trem para finalmente levar Walter de volta para casa. Mas chegando lá, Christine percebe que lhe trouxeram a criança errada. O estranho é que o garoto a que foi apresentada jura de pé junto que é Walter. O capitão J. J. Jones (Jeffrey Donovan) tenta convencê-la de que a emoção a deixou perturbada e diz que o garoto mudou em função dos meses que se passaram. Assim, Christine acaba levando seu suposto filho com ela. Mas Christine logo percebe que não está fazendo confusão alguma. Ela constata, por exemplo, que o menino que lhe foi entregue é alguns centímetros mais baixo que Walter e também não é circuncisado como seu filho. A partir daí, Christine inicia uma exaustiva batalha para provar que a polícia de LA se enganou. Porém, o capitão J. J. Jones se recusa a reconhecer o erro, visto que o fato de admitir o engano traria ainda mais problemas para a instituição. É quando aparece o reverendo Gustav Briegleb (John Malkovich), que durante muito tempo vem lutando para desmascarar as sujeiras que o Departamento de Polícia de LA varre para debaixo do tapete. Ele se dispõe a ajudar Christine no que fosse preciso e, juntos, os dois começam uma campanha para provar que Walter continua sumido. Na tentativa de calar Christine de qualquer forma, o capitão J. J. Jones a trancafia num hospital psiquiátrico. Ele deixa claro que a única maneira de Christine sair daquela situação seria assinando um documento em que ela ratificasse que o garoto encontrado é realmente Walter. Mas Christine se recusa veementemente a desistir de sua luta e encara uma verdadeira via-crúcis por seu filho desaparecido. Com muito empenho, o reverendo Briegleb consegue tirá-la do sanatório, assim como consegue liberação para todas as outras mulheres que foram injustamente mandadas para lá por terem ido contra os interesses da polícia. A esta altura, o espectador toma conhecimento de uma série de crimes a partir da captura de um jovem que diz ter sido obrigado pelo tio a participar de um esquema de seqüestro e assassinatos de crianças. Mortes que podem estar relacionadas com o desaparecimento de Walter. Christine então se desespera com o rumo que as coisas tomam. Em seguida, o assassino é capturado, julgado e condenado à morte. O Departamento de Polícia de LA também passa por julgamento e toda banda podre é desligada da corporação. Tempos depois, ela recebe a notícia de que um garoto foi encontrado, mas para sua tristeza não é o Walter. Ao menos, a partir do depoimento deste menino Christine descobre o quão nobre e solidário seu filho foi. Em meio à frustração de não ter Walter de volta, ela descobre que um sentimento que vinha se esvaindo dentro de si foi recuperado com toda a força: o de esperança. “A Troca” desperta a indignação do espectador de forma violentíssima. É uma intensa experiência emocional onde o nosso senso de justiça é potencializado a todo momento.


Por Gabriel Von Borell



ficha técnica:
título original:Changeling
gênero:Drama
duração:02 hs 21 min
ano de lançamento:2008
site oficial:http://www.changelingmovie.net/
estúdio:Imagine Entertainment / Malpaso Productions / Relativity Media
distribuidora:Universal Pictures
direção: Clint Eastwood
roteiro:J. Michael Straczynski
produção:Brian Grazer, Clint Eastwood, Robert Lorenz e Ron Howard
música:Clint Eastwood
fotografia:Tom Stern
direção de arte:Patrick M. Sullivan Jr.
figurino:Deborah Hopper
edição:Joel Cox e Gary Roach
efeitos especiais:CIS Vancouve

elenco:
Angelina Jolie (Christine Collins)
Gattlin Griffith (Walter Collins)
Michelle Martin (Sandy)
Michael Kelly (Detetive Lester Ybarra)
Frank Wood (Ben Harris)
John Malkovich (Reverendo Gustav Briegleb)
Colm Feore (Chefe James E. Davis)
Devon Conti (Arthur Hutchins)
Jeffrey Donovan (Capitão J.J. Jones)
Peter Gerety (Dr. Earl W. Tarr)
John Harrington Bland (Dr. John Montgomery)
Pamela Dunlap (Sra. Fox)
Roger Hewlett (Oficial Morelli)
Jason Butler Harner (Gordon Northcott)
Eddie Alderson (Sanford Clark)
Amy Ryan (Carol Dexter)
Dennis O'Hare (Dr. Jonathan Steele)
Kelly Lynn Warren (Rachel Clark)
Colby French (Bob Clark)
Geoffrey Pierson (S.S. Hahn)
Reed Birney (Prefeito Cryer)

terça-feira, 8 de setembro de 2009

"Planeta Terror"

“Planeta Terror” (Planet Terror, 2007) é a primeira parte do projeto dos diretores Robert Rodriguez e Quentin Tarantino intitulado como “Grindhouse”. A intenção dos cineastas era homenagear os filmes do estilo “exploitation”, muito populares durante a década de 70, que consiste na mistura de sexo e violência de uma forma bem sensacionalista para atrair o público. As características que marcavam esse tipo de produção era a falta de comprometimento com a qualidade técnica e artística e seu baixo orçamento. Grindhouse era o termo usado nos Estados Unidos para designar as salas de cinema onde estes filmes eram colocados em cartaz. Na maioria das vezes, eles eram exibidos em sessões duplas. O espectador pagava somente um ingresso e podia assistir a dois filmes. Fãs confessos do cinema trash, surgiu daí a idéia de Robert Rodriguez e Quentin Tarantino em lançarem seus filmes no formato 2 em 1. Coube a Rodriguez fazer a parte inicial do projeto, que ganhou o nome de “Planeta Terror”. A segunda parte ficou para Tarantino, que realizou seu “À Prova de Morte” (Death Proof, 2007). Ambos os longas são precedidos por trailers falsos e o de Rodriguez é antecedido por “Machete”. O ator Danny Trejo, que sempre participa dos filmes do diretor, interpreta o personagem homônimo do trailer. No falso preview, Trejo vive um mexicano sedento por uma vingança sanguinária. Nos Estados Unidos, o projeto fracassou nas bilheterias e os produtores optaram por lançar os filmes separadamente no restante do mundo. Para realizar um legítimo filme B, Robert Rodriguez escolheu o universo dos zumbis que atacam uma cidade interiorana. O diretor é um mestre no estilo trash e em “Planeta Terror” prova que está em plena forma dominando o estilo como ninguém. O filme abusa de criaturas que se arrastam, humanos se devorando, tiros e violência explícita. Tudo o que não pode faltar em um típico filme de zumbi. O sangue jorra na tela em meio à contaminação que invade uma pequena cidade. O diretor tem ótimas sacadas ao longo de “Planeta Terror” e aborda polêmicas recentes como militarismo, Osama Bin Laden, terrorismo e conflitos bélicos no Oriente Médio. Rodriguez também tem o mérito de ter criado uma heroína que já entrou para história do cinema por sua condição bizarra. A protagonista de “Planeta Terror” implanta uma poderosa metralhadora no lugar de uma das pernas depois de ter perdido a mesma num ataque de zumbis. Tudo começa quando um gás tóxico que os Estados Unidos utilizou de forma descompassada em suas campanhas pelo Oriente Médio se alastra por uma cidadezinha no Texas. O acidente faz com que as pessoas infectadas comecem a apresentar feridas pustulentas. Elas não viram zumbis porque não se tornam desmortos, mas passam a ter um olhar vago e se alimentar de carne humana. Cherry Darling (Rose McGowan) é uma desiludida go-go-girl que sonha se tornar uma comediante. Ela é a moça da famosa perna de metralhadora e junto com seu ex-namorado, El Wray (Freddy Rodriguez), vai liderar o grupo de sobreviventes que combate os zumbis tóxicos. A partir daí, surgem uma série de personagens e situações bizarras. Entra em cena a Dra. Dakota Block (Marley Shelton), uma anestesista que carrega em sua cinta-liga uma coleção de agulhas, que passa a ser utilizadas como arma. Dakota acaba provando do próprio veneno já que é atacada por seu marido, o Dr. William Block (Josh Brolin), que suspeita de uma traição. Assim, ela passa a maior parte do filme com as mãos anestesiadas. A personagem é responsável pelas cenas mais hilárias na tentativa de sobreviver enquanto suas mãos não respondem a nenhum comando. Tem também JT (Jeff Fahey), que é dono de uma espelunca e está mais preocupado em aperfeiçoar a receita de molho de seu churrasco do que com os zumbis. Até Quentin Tarantino participa de “Planeta Terror” como um militar sádico que tenta estuprar a anestesista, mas o gás transformou seu pênis num mingau. Ainda existem as participações de Bruce Willis, de Naveen Andrews (o Sayid do seriado Lost) e da cantora Fergie. “Planeta Terror” é demasiado exagerado. As performances do elenco, os diálogos e, claro, a violência são exagerados. E estes excessos conferem ao filme também um tom de comédia. Robert Rodriguez realiza, propositadamente, um filme ruim para entrar para a categoria dos ótimos filmes trashs. É diversão garantida para quem tem estômago forte.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
título original:Planet Terror
gênero:Terror
duração:01 hs 37 min
ano de lançamento:2007
site oficial:http://www.planetaterror.com.br
estúdio:Dimension Films / Rodriguez International Pictures / Troublemaker Studios
distribuidora:Europa Filmes
direção: Robert Rodriguez
roteiro:Robert Rodriguez
produção:Elizabeth Avellan, Robert Rodriguez, Quentin Tarantino e Erica Steinberg
música:Graeme Revell e Carl Thiel
fotografia:Robert Rodriguez
direção de arte:
figurino:Nina Proctor
edição:Ethan Maniquis e Robert Rodriguez
efeitos especiais:

elenco
Freddy Rodríguez (El Wray)
Rose McGowan (Cherry Darling)
Marley Shelton (Dra. Dakota Block)
Josh Brolin (Dr. William Block)
Michael Biehn (Xerife Hague)
Naveen Andrews (Abby)
Michael Parks (Earl McGraw)
Jerili Romeo (Ramona McGraw)
Tom Savini (Deputado Tolo)
Rebel Rodriguez (Tony Block)
Carlos Gallardo (Deputado Carlos)
Stacy Ferguson (Tammy)
Felix Sabates (Dr. Felix)
Hung Nguyen (Dr. Crane)
Julio Oscar Mechoso (Romey)
Jeff Fahey (J.T. Hague)
Bruce Willis (Tenente Muldoon)
James Parks (Edgar McCraw)
Quentin Tarantino

terça-feira, 25 de agosto de 2009

"Maria Antonieta"

As duras críticas recebidas em Cannes não fazem jus à “Maria Antonieta” (Marie Antoinette, 2007) de Sofia Coppola. O terceiro filme da herdeira de Francis Ford Coppola é franco e ousado. O maior erro da crítica talvez resida no fato de não ter compreendido a proposta de Sofia. Muitos condenaram a diretora por ignorar os fatos históricos e políticos presentes na revolução francesa. Sofia concentrou sua história nas particularidades da rainha da França e apenas fez sutis referências à situação política que os franceses viviam naquele momento. E para encarnar a sua Maria Antonieta, a diretora buscou novamente Kirsten Dunst (que também fez “As Virgens Suicidas”). A escolha não poderia ter sido melhor. A atriz está perfeita como a jovem rainha francesa despolitizada e festeira que peca pelos excessos. Kirsten demonstra enorme expressividade facial e em vários momentos expõe os sentimentos de Maria Antonieta sem necessariamente emitir um som. É simplesmente impecável. A fotografia de Lance Acord também é maravilhosa, assim como a direção de arte de Anne Seibel e o figurino de Milena Canonero. Para completar, o espectador é apresentado a uma trilha sonora contemporânea em pleno filme de época, com direito a Strokes e Gang of Four. A opção pela trilha confere ao longa um vigor moderno e jovial, do jeito que Sofia queria. Embora tenha uma narrativa demasiadamente lenta, que já virou marca registrada da diretora, “Maria Antonieta” tem uma atmosfera adolescente. Não à toa, Sofia inseriu uma cena em que um all-star surge na tela em meio aos sapatos caros que a rainha francesa ostentava em seu guarda-roupa. Com apenas 14 anos, a austríaca Maria Antonieta (Kirsten Dunst) é enviada à Paris para se casar com o príncipe Luís XVI (Jason Schwartzman). Logo que chega, a jovem se sente bastante desconfortável em meio às tradições da corte de Versalhes. Porém, não demora muito até Maria Antonieta entrar no jogo da corte e sucumbir aos encantos da vida palaciana. E assim desfrutar de exageros consumistas elevados a uma potência jamais pensada anteriormente. A vida dentro da nobreza é uma frivolidade só e a Maria Antonieta idealizada por Sofia mais parece uma patricinha em Versalhes, o que neste caso não é demérito algum. A fim de afastar o tédio, a jovem rainha leva uma vida farrista e inconseqüente. O filme também mostra o “drama” de sua vida conjugal. Luís XVI demorou sete anos para consumar o casamento. A languidez de seu marido fez com que Maria Antonieta sofresse durante um grande período. A rainha era atormentada pela mãe que se preocupava com uma possível anulação do casamento em função da demora na consumação do matrimônio. Ela também tinha que lidar com as pressões da corte que insinuavam que Maria Antonieta tinha algum problema para gerar um herdeiro. Sofia explorou o tema com bom humor através das tentativas frustradas da rainha em seduzir seu marido. Quanto à situação política, a rainha sempre deixava claro não se importar com o que acontecia fora do Palácio de Versalhes e fechava os olhos para as questões políticas. Quando a fase pré-Revolução Francesa estourou, os parisienses passavam fome e pediam pão ao passo que a corte francesa vivia extravagantemente. Algumas referências históricas afirmam que a rainha teria dito: “Se eles não têm pão, que comam brioches”. Sofia Coppola, em seu filme, trata de absolvê-la quando Maria Antonieta diz: “Imaginem se eu ia dizer uma idiotice dessas”. Fato é que os caprichos cometidos pela rainha francesa ao longo de sua vida em Versalhes causaram uma impopularidade gigantesca. A figura de Maria Antonieta não era vista com bons olhos pelo povo francês. Mas a rainha não se escondeu quando a revolta dos franceses foi iniciada e se recusou a fugir ou se esconder. Maria Antonieta se manteve sempre ao lado do marido e preferira a morte na guilhotina à fuga. E é de maneira brilhante, e grande sutileza, que Sofia Coppola anuncia o trágico fim da sua personagem. Em silêncio, a última cena ilustra o declínio da monarquia francesa através de uma simples imagem. “Maria Antonieta” é um filme um pouco diferente dos longas de época que costumamos ver. Diferente para melhor. Mas só aqueles que entenderem a proposta de Sofia saberão apreciar da forma devida.


Por Gabriel Von Borell




Ficha Técnica
Título Original: Marie Antoinette
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 123 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Japão / França): 2007
Site Oficial: www.marieantoinette-movie.com
Estúdio: Columbia Pictures Corporation / American Zoetrope
Distribuição: Columbia Pictures / Sony Pictures Entertainment
Direção: Sofia Coppola
Roteiro: Sofia Coppola
Produção: Sofia Coppola e Ross Katz
Música: Jean-Benoît Dunckel e Nicolas Godin
Fotografia: Lance Acord
Desenho de Produção: K.K. Barrett
Direção de Arte: Anne Seibel
Figurino: Milena Canonero
Edição: Sarah Flack
Efeitos Especiais: L'Etude et la Supervision des Trucages


Elenco
Kirsten Dunst (Maria Antonieta)
Marianne Faithfull (Maria Teresa)
Steve Coogan (Embaixador Mercy)
Judy Davis (Condessa de Noailles)
Jason Schwartzman (Rei Luís XVI)
Rose Byrne (Duquesa de Polignac)
Al Weaver (Conde d'Artois)
Shirley Henderson (Tia Sophie)
Molly Shannon (Tia Victoire)
Rip Torn (Luís XV)
Jean-Christophe Bouvet (Duque de Choiseul)
André Oumansky (Cardeal de la Roche)
Asia Argento (Madame du Barry)
Guillaume Gallienne (Vergennes)
Aurore Clément (Duquesa de Char)
Jean-Paul Scarpitta (Barão Scarpitta)
Lucien Rolland (Arcebispo de Reims)
Mary Nighty (Princesa Lamballe)
Clementine Poidatz (Condessa de Provence)
Clara Braiman

terça-feira, 11 de agosto de 2009

"Queime Depois de Ler"

Depois de atingir a consagração mundial com “Onde os Fracos Não Tem Vez” (No Country for Old Men, 2007), os irmãos Ethan e Joel Coen retornam às suas origens e realizam uma comédia recheada de humor negro, acidez, ironia e violência. “Queime Depois de Ler” (Burn After Reading, 2008) é uma grande sátira dos filmes de espionagem e coloca galãs de Hollywood como Brad Pitt e George Clooney em papéis ridículos fazendo o espectador rir de situações esdrúxulas. E, até mesmo, rir de si mesmo através de um processo de identificação com as situações bizarras vivenciadas pelos diferentes personagens. O longa dos irmãos Coen é extremamente sarcástico e tira sarro da moralidade fajuta e hipocrisia que impregna a sociedade americana. O elenco inspirado e numa sintonia perfeita garante boas gargalhadas e divertimento de qualidade. A química entre os atores é tão boa que não dá pra saber quem está melhor em cena. “Queime Depois de Ler” é acima de tudo um filme para não ser levado muito a sério. A trama começa quando o agente da CIA, Osbourne Cox (John Malkovich), é demitido da sua unidade por causa de seu “problema com bebida”. Irado, Cox não aceita o cargo burocrático em outro setor que lhe é oferecido e se desliga da CIA. Disposto a se vingar, o agora ex-agente resolve escrever um livro com as suas memórias e assim fazer revelações que podem comprometer a Agência de Inteligência norte-americana. Quando Cox conta à sua esposa Katie (Tilda Swinton) sobre seus novos planos, ela finalmente resolve se divorciar do marido para ficar com o segurança do governo Harry Pfarrer (George Clooney), um sujeito canastrão que se gaba de nunca ter precisado disparar um tiro em 20 anos de profissão. Com a intenção de analisar todo o patrimônio de Cox antes de entrar com o pedido de divórcio, Katie rouba arquivos do computador pessoal do ex-agente para que seu advogado avalie o material durante a separação. Porém, acidentalmente, o CD cai nas mãos de dois funcionários de uma academia de ginástica no subúrbio. Julgando se tratar de arquivos confidenciais e importantíssimos da CIA, Linda Litzke (Francis McDormand) encara o CD como a oportunidade perfeita para finalmente conseguir fazer as cirurgias plásticas que tanto deseja, mas que até agora não foi possível por questões financeiras. Linda elabora um plano para chantagear Cox junto com ajuda do instrutor de ginástica Chad Feldheimer (Brad Pitt). Neste momento se inicia um processo de paranóia coletiva e conspiração sobre absolutamente nada. Os personagens começam a se cruzar de diferentes e tortuosas maneiras, contribuindo para uma confusão ainda maior. “Queime Depois de Ler” brinca com o fato do quão ridículo e idiota podem ser os seres humanos e ironiza o tempo todo os estereótipos que estão presentes ao nosso redor. E deixa claro que o importante é não perder o bom humor, mesmo diante de tantas bizarrices.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: Burn After Reading
Gênero: Comédia
Tempo de Duração: 96 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Inglaterra / França): 2008
Site Oficial: www.burnafterreading.com
Estúdio: Working Title Films / Studio Canal / Relativity Media / Mike Zoss Productions
Distribuição: Focus Features / Paramount Pictures / UIP
Direção: Joel Coen e Ethan Coen
Roteiro: Joel Coen e Ethan Coen
Produção: Tim Bevan, Ethan Coen, Joel Coen e Eric Fellner
Música: Carter Burwell
Fotografia: Emmanuel Lubezki
Desenho de Produção: Jess Gonchor
Direção de Arte: David Swayze
Figurino: Mary Zophres
Edição: Joel Coen e Ethan Coen
Efeitos Especiais: Brainstorm Digital / Big Film Design


Elenco
George Clooney (Harry Pfarrer)
Frances McDormand (Linda Litzke)
John Malkovich (Osbourne Cox)
Tilda Swinton (Katie Cox)
Brad Pitt (Chad Feldheimer)
Richard Jenkins (Ted Treffon)
Elizabeth Marvel (Sandy Pfarrer)
Olek Krupa (Krapotkin)
Michael Countryman (Alan)
Hamilton Clancy (Peck)
Armand Schultz (Olson)
Brian O'Neill (Hal)
David Rasche (Oficial da CIA)
J.K. Simmons (Superior da CIA)
Dermott Mulroney (Astro de "Coming Up Baby")

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

"O Menino do Pijama Listrado"

Adaptação do famoso livro de John Boyne, “O Menino do Pijama Listrado” (The Boy in the Striped Pyjamas, 2008), dirigido pelo inglês Mark Herman, é um filme emotivo e impactante. O longa narra uma história sobre o nazismo e suas atrocidades a partir de uma perspectiva diferente das quais estamos habituados. O conflito entre alemães e judeus aqui é retratado sob a ótica ingênua de duas crianças. Um enorme contraste. De um lado está o filho de um militar alemão desfrutando de todas as mordomias que o sistema lhe proporciona. De outro está um menino judeu de dentes apodrecidos e com fome preso num campo de concentração. Apesar de pertencerem a universos tão distantes, apenas uma grade elétrica separa os dois garotos. A maior sacada do diretor reside no fato de deixar de lado as crueldades do regime nazista, ciente de que o espectador já sabe de tudo que aconteceu naquele período, e se concentrar na amizade que é construída pelas duas crianças. Herman apenas sugere as atrocidades através de suas imagens. Como, por exemplo, quando aparecem as chaminés do campo de concentração soltando uma forte fumaça e o público entende o horror por trás daquela nuvem negra no céu. Com muito bom gosto e sem apelações, o cineasta toca o espectador ao mostrar a inocência em meio a uma guerra. Sem se dar conta da destruição que acontece ao seu redor, as crianças se mostram completamente alheias ao ódio disseminado por suas origens e imersas em seus próprios universos. E o talento dos dois protagonistas é parte fundamental da história. Os meninos Asa butterfield e Jack Scanlon estão perfeitos em seus papéis. Assim como Vera Farmiga, que interpreta a mãe do garoto alemão. Bruno (Asa Butterfield) é um menino de oito anos que, filho de um oficial nazista, se vê obrigado a mudar de vizinhança e abandonar seus amigos. Seu pai (David Thewlis) administrará o campo de concentração de Auschwitz e Bruno não fica nada contente de ter de se mudar para o interior. Logicamente, o menino não sabe da atividade do pai e pensa que as pessoas que vivem próximas à sua nova casa são apenas “fazendeiros”. Entediado pela falta de companhia, Bruno decide explorar as imediações do lugar e acaba descobrindo o campo de concentração que seu pai coordena. Lá, ele conhece Schmuel, um garoto da sua idade que foi enviado ao campo e nem mesmo sabe o porquê. Separados por uma cerca eletrificada, Bruno logo indaga sobre o número presente na camiseta de Schmuel e sobre seu “pijama listrado” (uniforme que todos os judeus eram obrigados a usar dentro do campo de concentração). Mas é óbvio que Schmuel não sabe explicar sobre isto e apenas explica que todos devem usar o tal “pijama” e todos também carregam números. Quando chega a vez de Schmuel perguntar sobre a vida de Bruno a primeira dúvida do menino é se existe comida onde Bruno mora. A partir daí, vai se construindo uma forte amizade entre os dois e todos os dias os garotos se encontram naquele mesmo local. Enquanto isso, a mãe de Bruno (Vera Farmiga), aos poucos, percebe a participação de seu marido nos absurdos cometidos pelo regime nazista. A moça passa a sofrer conforme vai notando que se casara com um homem que não era bem aquilo que ela pensava ser. Tentando proteger seus filhos de toda aquela monstruosidade, ela é obrigada a ver sua filha mais velha, Gretel (Amber Beattie), ser doutrinada por um professor nazista responsável pelo ensino particular das crianças. Ele realiza uma verdadeira lavagem cerebral na garota e deixa sua mãe cada vez mais assustada com a situação na Alemanha. Bruno acaba não sendo afetado já que na maioria das vezes não entende as idéias de seu professor. Quando seu pai resolve colocar sua família novamente de mudança, em função dos problemas que o nazismo traz para o seu casamento, Bruno não aceita a novidade por causa da amizade que construiu com Schmuel. Ao contar a má notícia a Schmuel, o garoto judeu diz que seu pai está desaparecido e Bruno resolve ajudar a encontrá-lo. Para isto, eles planejam um modo de colocar Bruno dentro do campo de concentração sem levantar suspeitas. Schmuel arranja um uniforme para o amigo e Bruno leva uma pá até o campo para cavar um buraco e assim poder passar por debaixo da cerca. Só que esta atitude dos garotos trará conseqüências terríveis. Uma triste e cruel ironia do destino se anuncia. E “O Menino do Pijama Listrado” chega ao seu clímax chocando até mesmo o mais insensível dos espectadores que, conduzido pela excelente trilha sonora de James Horner, mal pode acreditar no desfecho que acabou de assistir.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: The Boy in the Stripped Pyjamas
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 94 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Inglaterra): 2008
Site Oficial: www.boyinthestripedpajamas.com
Estúdio: BBC Films / Miramax Films / Heyday Films
Distribuição: Miramax Films / Buena Vista International
Direção: Mark Herman
Roteiro: Mark Herman, baseado em livro de John Boyne
Produção: David Heyman
Música: James Horner
Fotografia: Benoît Delhomme
Desenho de Produção: Martin Childs
Direção de Arte: Mónica Esztán, Rod McLean, Razvan Radu e Szilvia Ritter
Figurino: Natalie Ward
Edição: Michael Ellis


Elenco
Asa Butterfield (Bruno)
Zac Mattoon O'Brien (Leon)
Domonkos Németh (Martin)
Henry Kingsmill (Karl)
Vera Farmiga (Mãe)
David Thewlis (Pai)
Cara Horgan (Maria)
Amber Beattie (Gretel)
László Áron (Lars)
Béla Fesztbaum (Schultz)
Attila Egyed (Heinz)
Rupert Friend (Tenente Kotler)
David Hayman (Pavel)
Jack Scanlon (Schmuel)
László Nádasi (Isaak)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

"Dúvida"


Dezoito anos depois de estrear nas telas de cinema com “Joe Contra o Vulcão” (Joe Versus the Volcano, 1990), John Patrick Shanley realiza “Dúvida” (Doubt, 2008), adaptando para o cinema sua peça homônima vencedora do prêmio Pulitzer em 2005. Com uma direção e roteiro brilhantes, Shanley apresenta ao público uma verdadeira obra-prima. Nem os resquícios da origem teatral diminuem os méritos do filme, pelo contrário, neste caso funciona muito bem. Não há diálogo que se dispense em “Dúvida”. E para contar uma história repleta de diálogos longos, porém poderosos e desconcertantes, o diretor escalou um elenco de primeira. A começar pela sempre magistral Meryl Streep. Como conseqüência, “Dúvida” recebeu quatro indicações ao Oscar 2009 em função de seus atores. Streep foi indicada como Melhor Atriz e o excelente Philip Seymor Hoffman como Melhor Ator. E as atrizes Amy Adams e Viola Davis concorreram para o prêmio de Melhor Atriz coadjuvante. Esta última com uma performance surpreendente, que justifica totalmente o fato de ter sido indicada ao Oscar apesar de aparecer em cena somente por alguns minutos. Uma pena interpretações tão apoteóticas não terem sido reconhecidas através da premiação máxima do cinema mundial. O longa de Shanley ainda recebeu a indicação de Melhor Roteiro Adaptado. “Dúvida” é um filme que trata, como o próprio título sugere, das incertezas e indagações que permeiam às nossas cabeças. Ao assistir ao filme mergulhamos num verdadeiro mar de dúvidas onde tudo parece suspeito e a certeza parece algo inatingível. E dentro deste contexto, o espectador é convidado a participar da narrativa e compartilhar do que é visto em cena. Assim, somos obrigados a duvidar, a todo momento, de todos os personagens, desconfiando de suas verdadeiras motivações e conduta. E nesta guerra de argumentos e contra-argumentos, constatamos que não há certeza ou dúvida absoluta. A trama se passa em meados dos anos 60, numa escola católica dirigida por padres e freiras. Lá, a doce e ingênua irmã James (Amy Adams)começa a levantar suspeitas sobre o relacionamento entre um padre e um aluno seu. O estudante em questão é Donald Miller (Joseph Foster), o primeiro e único aluno negro do tradicional colégio. O garoto torna-se o protegido do padre Flynn (Philip Seymor Hoffman), que se aproxima de Donald sob alegação de que o menino parece excluído dos demais estudantes. Em uma de suas aulas, a irmã James percebe que, ao voltar de uma conversa na sala do padre, Donald retorna com cheiro de vinho em seu hálito e se comportando de maneira estranha. Preocupada com o que possa estar acontecendo, a freira leva o assunto até a sua superiora, a conservadora e rígida irmã Aloysius (Meryl Streep). Em tempos de mudança, Aloysius se esforça para manter o tradicionalismo da escola enquanto Flynn se opõe às suas idéias lutando para que o colégio se modernize junto com o tempo. Como já não gosta do padre por achá-lo progressista demais, a irmã Aloysius apresenta uma pré-disposição a considerar a conduta dele inadequada e passa a investigar o caso por achar que o padre Flynn esteja mantendo um relacionamento impróprio com Donald. Porém, a certeza cega da irmã Aloysius não se sutenta em nenhum tipo de prova. Aloysius chega, inclusive, a conversar com a mãe do garoto, Sra Miller (Viola Davis), que numa cena belíssima, faz revelações íntimas e perturbadoras. “Dúvida” discorre num universo de suposições e seu roteiro primoroso confere ao espectador a penosa missão de condenar ou absolver o padre. Quando o filme parece nos direcionar para o caminho da absolvição logo depois acontece algo que nos enche de dúvidas novamente. Até que ponto nossas suspeitas são infundadas? Às vezes aquilo que parece não é, ou talvez seja. É difícil saber. No final, testemunhamos que até o mais convicto dos convictos no fundo esconde suas dúvidas. E a verdade talvez seja apenas um detalhe.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: Doubt
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 104 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2008
Site Oficial: www.doubt-themovie.com
Estúdio: Scott Rudin Productions / Goodspeed Productions
Distribuição: Walt Disney Studios Motion Pictures / Miramax Films
Direção: John Patrick Shanley
Roteiro: John Patrick Shanley, baseado em peça teatral de John Patrick Shanley
Produção: Mark Roybal e Scott Rudin
Música: Howard Shore
Fotografia: Roger Deakins
Desenho de Produção: David Gropman
Direção de Arte: Peter Rogness
Figurino: Ann Roth
Edição: Dane Collier e Dylan Tichenor


Elenco
Meryl Streep (Irmã Aloysius Beauvier)
Philip Seymour Hoffman (Padre Brendan Flynn)
Amy Adams (Irmã James)
Viola Davis (Sra. Miller)
Alice Drummond (Irmã Veronica)
Audrie J. Neenan (Irmã Raymond)
Susan Blommaert (Sra. Carson)
Carrie Preston (Christine Hurley)
John Costelloe (Warren Hurley)
Lloyd Clay Brown (Jimmy Hurley)
Joseph Foster (Donald Miller)
Bridget Megan Clark (Noreen Horan)
Mike Roukis (William London)
Frank Shanley (Kevin)
Frank Dolce (Ralph)
Paulie Litt (Tommy Conroy)
Matthew Marvin (Raymond)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

"O Casamento de Rachel"


Jonathan Demme (“O Silêncio dos Inocentes” e “Filadélfia”) é realmente um diretor de múltiplas facetas. Em “O Casamento de Rachel” (Rachel Getting Married, 2008), o cineasta traz um filme diferente de tudo que já fez antes. Com uma direção precisa e segura, Demme opta por abandonar o estilo mais convencional e parte com a câmera na mão para conseguir um efeito em tela belíssimo. O tom de gravação caseira, com direito a tremulações de imagem e cortes secos, potencializa o grau de intimidade do espectador e o envolvimento com a história se torna muito maior. A fotografia nervosa parece traduzir a ebulição que está presente na família retratada em cena. O roteiro escrito por Jenny Lumet, filha do diretor Sidney Lumet, é formidável e através de diálogos rápidos e naturais cria uma ótiica familiar forte e realista. Anne Hathaway é o grande destaque do elenco. A atriz deixa de lado as mocinhas que a catapultaram ao estrelato para dar vida a uma jovem problemática, com uma das atuações mais elogiadas pela crítica no ano passado. Uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz só confirma a feliz escolha e o talento de Hathaway. Na trama, ela é Kym, uma viciada em álcool e drogas que volta para casa depois que a clínica de reabilitação, onde tem passado os últimos dois anos, a libera para ir ao casamento de sua irmã Rachel (Rosemary DeWitt). O retorno de Kym traz à tona lembranças que todos prefeririam esquecer. O pai das duas moças, Paul, (Bill Irwin), se mostra zeloso com a filha mais nova, muito por conta de seu estado de recuperação. Porém, esta situação acaba incomodando Rachel, que gostaria de ser o centro das atenções pelo menos no dia de seu casamento. Embora as duas demonstrem bastante cumplicidade, elas vivem alfinetando uma à outra. Desde que se separou de Paul, a mãe, Abby (Debra Winger), revela um aparente descaso com as filhas e só aparece pela primeira vez na tela durante o ensaio de casamento. À medida que a casa é tomada pelos preparativos da festa os conflitos entre os membros desta família vão se revelando e Kym parece ser o fio condutor de todos os problemas desencadeados ao longo do tempo. Todas as mágoas, todos os ressentimentos estão ligados à figura de Kym de akguma maneira. Não há nada que se possa fazer para apagar os traumas do passado. Paul tenta contemporizar as discussões, mas parece que vai desmoronar a todo momento. A tragédia que abateu esta família anos atrás é avassaladora e não perdoa ninguém. Um exemplo desta constatação está na cena em que mãe e filha deixam para trás o distanciamento e tentam uma aproximação. Fica evidente que Abby culpa Kym e vice-versa e este conflito resulta numa das cenas mais fortes do filme. O longa de Jonathan Demme mostra as dificuldades de uma jovem que precisa lidar com as suas inseguranças e buscar uma maneira de acertar seu próximo passo. “O Casamento de Rachel” permanece na sua cabeça por horas a fio e faz o espectador refletir sobre as conseqüências psicológicas de uma tragédia. Como é possível seguir em frente? Existe uma maneira de superar uma grande perda? Como amar e ser amado culpando uns aos outros? Aquele tipo de resposta que nem depois de muito pensar chegamos a uma conclusão.


Por Gabriel Von Borell




Ficha Técnica
Título Original: Rachel Getting Married
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 114 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2008
Site Oficial: www.sonyclassics.com/rachelgettingmarried
Estúdio: Clinica Estetico / Marc Platt Productions
Distribuição: Sony Pictures Releasing
Direção: Jonathan Demme
Roteiro: Jenny Lumet
Produção: Neda Armian e Marc E. Platt
Música: Donald Harrison Jr. e Zefer Tawil
Fotografia: Declan Quinn
Desenho de Produção: Ford Wheeler
Direção de Arte: Kim Jennings
Figurino: Susan Lyall
Edição: Tim Squyres
Efeitos Especiais: Brainstorm Digital / Click 3X


Elenco
Anne Hathaway (Kym)
Rosemarie DeWitt (Rachel)
Mather Zickel (Kieran)
Bill Irwin (Paul)
Anna Deavere Smith (Carol)
Anisa George (Emma)
Tunde Adebimpe (Sidney)
Debra Winger (Abby)
Jerome Le Page (Andrew)
Beau Sia (Norman Sklear)
Dorian Missick (Dorian Lovejoy)

terça-feira, 30 de junho de 2009

"Eu e as Mulheres"

Jon Kasdan, filho do experiente diretor Lawrence Kasdan (de “Corpos Ardentes” e “O Reencontro), estréia discretamente no cinema com um filme singelo e cativante. “Eu e as Mulheres” (In the Land of Women, 2007) pode parecer um tanto superficial num primeiro momento (até pelo título bobo em português), mas se revela uma grata surpresa ao longo de seus 97 minutos. Assinando também o roteiro do longa, Kasdan usa uma ótica realista e humana para contar uma história pouco original. “Eu e as Mulheres” é conduzido pela angústia que absorve os seus personagens, mesmo que o drama se contextualize sem um aprofundamento. O filme de Kasdan é despretensioso e sua direção não decepciona. O diretor acerta na dose de drama, romance e comédia, e assim evita lágrimas desnecessárias. “Eu e as Mulheres” faz você refletir sobre a condição humana e repensar seus conceitos acerca das coisas realmente importantes na vida. Adam Brody (mais conhecido como Seth Cohen de “The O.C”) inicia sua carreira cinematográfica no papel principal desta história. O ator comprova seu talento e desperta a simpatia do espectador com uma atuação sensível. Mas o destaque vai para Meg Ryan que consegue comover sem ser piegas, com um toque de delicadeza nas cenas mais dramáticas. Carter Webb (Adam Brody) é um jovem escritor frustrado. Ele tem o sonho de escrever um grande livro, mas leva a vida criando roteiros para filmes pornôs. Quando leva um fora de sua namorada, Sofia (Elena Anaya), uma atriz em ascensão, Carter, decide, então, passar uma temporada na casa de sua avó, Phyllis (Olympia Dukakis), que vive numa pacata cidade do subúrbio americano. O objetivo é se livrar da depressão que o fim do namoro trouxe e finalmente escrever o livro que deseja realizar há 11 anos. Chegando lá, o jovem conhece Sarah (Meg Ryan), uma típica dona-de-casa americana que descobre que está com um câncer de mama, e suas duas filhas: a rebelde Lucy (Kristen Stewart) e a precoce Paige (Mackenzie Vega). Estas três mulheres transformam a vida de Carter de uma maneira que ele jamais imaginara. Assim como o jovem escritor acaba influenciando também na conduta de cada uma delas. Uma lição de amadurecimento é processada por todos os personagens de diferentes formas, independente de sua idade. Todos nós temos sempre algo a aprender na vida. Carter se torna uma espécie de conselheiro para Sarah e Lucy, e até para a pequena Paige. O rapaz é obrigado a lidar com o universo feminino enquanto ele mesmo ainda se encontra confuso em relação aos seus sentimentos. Este encontro promete ajudar a consertar relações desajustadas, entender amores mal resolvidos e, inclusive, refletir sobre a morte e o propósito da vida. E no final estas experiências são fundamentais para que todos os personagens encontrem, cada um ao seu modo, a solução para seus conflitos existenciais. “Eu e as Mulheres” é uma viagem cheia de poesia sobre descobertas, frustrações e recomeços. Pode não ser um filme tão profundo, mas faz o espectador pensar em seus próprios erros e acertos na vida quando os créditos sobem.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: In the Land of the Women
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 97 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2007
Estúdio: Land Films Inc. / Castle Rock Entertainment / Anonymous Content
Distribuição: Warner Bros. Pictures / Focus Filmes
Direção: Jon Kasdan
Roteiro: Jon Kasdan
Produção: Steve Golin e David Kanter
Música: Stephen Trask
Fotografia: Paul Cameron
Desenho de Produção: Sandy Cochrane
Direção de Arte: Margot Ready
Figurino: Trish Keating
Edição: Carol Littleton e Marty Levenstein


Elenco
Elena Anaya (Sofia Buñuel)
Adam Brody (Carter Webb)
Rob Reinis (Avi Rosenberg)
JoBeth Williams (Agnes Webb)
Makenzie Vega (Paige Hardwicke)
Kristen Stewart (Lucy Hardwicke)
Meg Ryan (Sarah Hardwicke)
Olympia Dukakis (Phyllis)
Dustin Milligan (Eric Watts)
Graham Wardle (Gabe Foley)
Elise Gatien (Tiffany)
Clark Gregg (Nelson Hardwicke)
Jeff Cunningham (Howard Portchnik)
Karin Konoval (Dra. Ida Rosen)
Ginnifer Goodwin (Janey)
Kelsey Keel (Adolescente)

terça-feira, 23 de junho de 2009

"Volver"


Pedro Almodóvar apresenta seu trabalho mais bairrista com “Volver” (Volver, 2006). Ainda bem que se trata de um diretor com talento suficiente para não fazer disto um problema e assim sua história pode emocionar os quatro cantos do mundo. Retornando às suas raízes com um filme essencialmente cômico, apesar de tocar em assuntos nada agradáveis como morte e incesto, Almodóvar disserta sobre o amor. Não o amor carnal, de casais e amantes. Mas daquele tipo que se estabelece nas relações de uma família. O amor familiar, que transcende o plano físico. “Volver” é um longa, como o título sugere, sobre a volta. Todos nós voltamos para algo em determinadas fases da vida. Voltar pode ser dolorido, pode ressuscitar mágoas, mas às vezes é tudo o que precisamos para seguir em frente. É o que se faz necessário para que feridas se fechem e um ciclo seja completado para que outro possa se iniciar. E para ilustrar estas “voltas”, Almodóvar se apodera do universo feminino. Escalando um elenco predominantemente de mulheres, a emoção se traduz com uma carga ainda mais forte. Em “Volver”, os personagens masculinos não passam de referências pontuais. O diretor volta a trabalhar com sua grande musa, Carmen Maura, que atuou em todos os filmes de Almodóvar na década de 80. A atriz retorna em grande estilo casando perfeitamente o tom entre a comédia e o drama. Penelope Cruz também está sublime e traz a melhor performance da sua carreira. Sua atuação em “Volver” rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz em 2007. A história centra-se nas vidas das protagonistas Raimunda (Penelope Cruz) e Soledad (Lola Dueñas). Duas irmãs que perderam seus pais durante um incêndio na antiga vila onde moravam. O que elas não sabem é que esta tragédia enterrou segredos inimagináveis. Hoje, Raimunda vive com o marido Paco (Antonio de la Torre) e sua filha Paula (Yohana Cobo). Já Soledad mantém um salão de beleza clandestino em seu próprio apartamento e vive solitária desde que seu marido fugiu com uma de suas clientes. Raimunda vive uma fase difícil, pois sustenta a casa sozinha já que seu marido é preguiçoso e está desempregado. Tudo se complica quando Paula acaba matando seu padrasto quando este, bêbado, tenta abusar sexualmente da menina. Para piorar, no momento em que Raimunda se vê às voltas com este pepino, Soledad liga para a irmã para avisar sobre o falecimento da querida tia Paula (Chus Lampreave). Tendo que resolver a situação de sua filha e do marido morto, Raimunda avisa que não poderá comparecer ao funeral. Então, Soledad viaja só até a aldeia em que a tia morava. Enquanto Raimunda busca meios de salvar Paula. Neste meio tempo, Raimunda é procurada pela vizinha da falecida, Agustina (Blanca Portillo). A moça está com um câncer terminal e deseja desesperadamente saber sobre o paradeiro de sua mãe, que sumiu logo depois do fatídico incêndio. Agustina acredita que Raimunda possa ajudá-la já que o fantasma de Irene (Carmen Maura), mãe de Raimunda e Soledad, cuidava da tia Paula. E se Irene fizesse uma aparição para Raimunda elas poderiam descobrir se a mãe de Agustina está viva ou não. Aliás, em “Volver” a temática fantasmal é a chave para a comédia. Raimunda não se mostra muito otimista com a proposta porque mãe e filha tiveram suas diferenças em vida e lidar com a memória de Irene significa lidar com memórias dolorosas. Porém, uma grande reviravolta está para acontecer na vida de Raimunda e Soledad, obrigando as duas irmãs a, finalmente, acertarem suas contas com o passado. É incrível como certos diretores conseguem imprimir sua marca em suas obras. Basta assistir “Volver” para perceber que aquele plano é de Almodóvar, que aquelas cores fortes e músicas intensas são do mestre espanhol. E também com “Volver”, você deixa de enxergar o aspecto sombrio da morte e abre os olhos para o encantamento presente no viver.


Por Gabriel Von Borell




Ficha Técnica
Título Original: Volver
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 121 minutos
Ano de Lançamento (Espanha): 2006
Site Oficial: www.sonyclassics.com/volver
Estúdio: Canal+ España / El Deseo S.A. / TVE / Ministerio de Cultura
Distribuição: Sony Pictures Classics / Fox Film do Brasil
Direção: Pedro Almodóvar
Roteiro: Pedro Almodóvar
Produção: Esther García
Música: Alberto Iglesias
Fotografia: José Luis Alcaine
Desenho de Produção: Salvador Parra
Figurino: Sabine Daigeler
Edição: José Salcedo
Efeitos Especiais: El Ranchito


Elenco
Penélope Cruz (Raimunda)
Carmen Maura (Avó Irene)
Lola Dueñas (Sole)
Blanca Portillo (Agustina)
Yohana Cobo (Paula)
Chus Lampreave (Tia Paula)
Antonio de la Torre (Paco)
Carlos Blanco (Emilio)
Maria Isabel Diaz (Regina)
Neus Sanz (Inês)
Carlos Garcia Cambero (Carlos)
Leandro Rivera (Auxiliar)
Yolanda Ramos (Apresentadora de TV)
Pilar Castro (Ajudante da apresentadora)

quinta-feira, 18 de junho de 2009

"Neve Sobre Os Cedros"

Em “Neve Sobre Os Cedros” (Snow Falling On Cedars, 1999), o diretor Scott Hicks narra um período da história dos Estados Unidos que muitos americanos prefeririam esquecer. O filme é um retrato do preconceito étnico contra os nipo-americanos depois do ataque dos japoneses a Pearl Harbor. Hicks mostra como grandes injustiças podem ser cometidas por mera discriminação e julgamentos equivocados. Rico em detalhes, “Neve Sobre Os Cedros” é uma contundente metáfora para desconstruir o preconceito que existia na época. Uma história sobre superação de traumas, que muitas vezes são impostos a nós por pressões sociais. Para contar este complexo período, o diretor escalou um ótimo elenco. Destaque para a atriz japonesa Youki Kudoh. O longa apresenta os conflitos raciais desencadeados pela Segunda Guerra numa aldeia de pescadores da Costa da Califórnia. Paralelamente, “Neve Sobre Os Cedros” aproxima duas culturas através do amor proibido entre o personagem de Ethan Hawke e o de Youki Kudoh. Ishmael (Ethan Hawke) e Hatsue (Youki Kudoh) são cidadãos americanos que se conhecem desde crianças e se apaixonam perdidamente. O único problema é a origem nissei de Hatsue, que obriga os dois a manterem seu relacionamento em segredo, já que suas famílias jamais aceitariam o romance. Tudo se complica quando o Japão ataca a base de Pearl Harbor. Os nipo-americanos são enviados para campos de concentração pelo governo dos Estados Unidos. Assim, as chances do casal de permanecer junto são dizimadas em função dos conflitos inter-raciais que se estabelecem em território americano. Hatsue decide terminar tudo com Ishmael. Atordoado com a perda de seu grande amor, Ishmael é mandado para a guerra e perde seu braço durante um confronto. Ele passa a culpar, inconscientemente, Hatsue pela fatalidade e isto faz com que a lembrança da jovem sempre esteja presente em sua mente. Anos depois, os destinos deles se cruzam novamente quando o marido de Hatsue, Kazuo (Rick Yune), é acusado de assassinar seu melhor amigo de infância na época do aniversário do ataque a Pearl Harbor. O suposto assassinato acontece em circunstâncias misteriosas e a culpa recai sobre Kazuo. Alguns indícios apontam para o marido de Hatsue e a família da vítima quer sua condenação mesmo sem uma prova cabal do crime. Com uma fotografia belíssima, que rendeu uma indicação ao Oscar de Melhor Fotografia, e um tratamento de luzes maravilhoso, “Neve Sobre Os Cedros” transcorre no formato de flashbacks e vai esmiuçando seu enredo conforme os personagens vão sendo chamados a depor no julgamento. A cuidadosa e eficiente trilha sonora também ajuda a compor a trama. Sendo hoje um jornalista, Ishmael acaba investigando o caso e se envolvendo cada vez mais à medida que o julgamento vai ganhando seus contornos finais. O jornalista se encontra em meio a um grande dilema: ajudar àquela que lhe causou um imenso mal no passado e ainda por cima salvar o homem que está casado com sua amada. Superando todo o ressentimento que sente, Ishmael assume um papel determinante para o desenrolar dos fatos, num claro exemplo de profissional ético. A contribuição de Ishmael no tribunal prova o quanto uma determinada situação social pode causar danos e injustiças irreparáveis na vida das pessoas. Os preconceitos mascararam a realidade e ocultam a verdade que está diante de nossos olhos. “Neve Sobre Os Cedros” é, acima de tudo, uma trama sobre justiça. É uma amostra de que nem tudo é o que parece ser. Às vezes uma revelação pode mudar tudo.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: Snow Falling on Cedars
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 127 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1999
Site Oficial: www.snowfallingoncedars.com
Estúdio: Universal Pictures
Distribuição: Universal Pictures / UIP
Direção: Scott Hicks
Roteiro: Ronald Bass e Scott Hicks, baseado em livro de David Guterson
Produção: Ronald Bass, Kathleen Kennedy, Frank Marshall e Harry J. Ufland
Música: James Newton Howard
Direção de Fotografia: Robert Richardson
Desenho de Produção: Jeaninne Claudia Oppewall
Direção de Arte: William Arnold e Doug Byggdin
Figurino: Renee Ehrlich Kalfus
Edição: Hank Corwin
Efeitos Especiais: Industrial Light & Magic / Sony Pictures Imageworks

Elenco
Ethan Hawke (Ishmael Chambers)
James Cromwell (Juiz Fielding)
Richard Jenkins (Xerife Art Moran)
James Rebhorn (Alvin Hooks)
Sam Shepard (Arthur Chambers)
Zeljko Ivanek (Dr. Whitman)
Eric Thal (Carl Heine Jr.)
Max von Sydow (Nels Gudmundsson)
Youki Kudoh (Hatsue Miyamoto)
Rick Yune (Kazuo)

quinta-feira, 11 de junho de 2009

"Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas"


Em “Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas” (Big Fish, 2003), Tim Burton conta uma história fantástica cheia de encanto e magia que envolve o espectador. E dentro deste universo, o diretor dispõe de um espaço ilimitado para trabalhar toda a sua criatividade e imaginação. O clima do longa lembra a obra-prima “Edward: Mãos de Tesoura” (Edward Scissorhands, 1990), com sua estética sombria e colorida ao mesmo tempo. Não à toa a música tema do filme estrelado por Johnny Depp foi utilizada no trailler de “Peixe Grande”. O imaginário é o carro-chefe da história e conduz a trama até seu final. A saga de Edward Bloom, personagem principal do filme, é bonita e inspiradora. Burton consegue emocionar mesmo com seu estilo, no mínimo, pouco convencional. “Peixe Grande” é sentimental sem ser piegas, e, acima de tudo, uma fábula deliciosa e divertida. Cativante em muitos momentos. As situações bizarras apresentadas por Burton não caem no ridículo justamente por causa do tom exagerado que o diretor imprime ao seu filme, prova cabal do talento de Tim Burton. A escalação de Ewan McGregor e Albert Finney para interpretar Edward Bloom, em sua fase jovem e idosa respectivamente, foi muito feliz devido à semelhança entre os dois. Assim como Burtoin acertou na escolha de Alison Lohman e Jessica Lange para viver sua amada Sandra. As duas atrizes possuem traços bem parecidos. Estes pontos ajudam ainda mais a dar autenticidade à obra burtiana. A metáfora presente no título do filme reside na magnitude dos feitos de seu protagonista. Um peixe grande não pode ser posto num aquário pequeno demais. Ele precisa de espaço, de sair para explorar o mundo. Se guardado num aquário pequeno o peixe permanece pequeno, mas quando não existem barreiras ele cresce. Edward Bloom é como o peixe, alguém que precisa de mobilidade. Existe uma necessidade inata de conhecer as coisas, de sair para o mundo. Conhecemos a vida deste contador de histórias através de flashbacks. Edward Bloom (Albert Finney) tem o dom de cativar as pessoas com suas histórias criativas e mágicas, que mais parecem terem sido retiradas de um livro infantil. De tão surreais, os seus causos levantam suspeitas quanto à veracidade dos fatos. Mas a ninguém isto parece incomodar, e assim Edward Bloom conquista a simpatia de todos por onde passa. Porém, toda esta imaginação cria mágoas profundas numa das pessoas mais importantes de sua vida: seu filho Will (Billy Crudup). A objetividade jornalística de Will o impede de aceitar as histórias do pai, que jura de pés juntos que tudo realmente aconteceu. E conforme o tempo passa mais vai crescendo um abismo na relação dos dois. Will não entende o comportamento de Edward e alega que é impossível conhecer verdadeiramente seu pai diante de tanta fantasia. O jovem sente como se tivesse sido enganado durante sua vida inteira. Porém, quando Edward fica muito doente surge a oportunidade de apaziguar este relacionamento conturbado de pai e filho. A mãe de Will, Sandra (Jessica Lange), liga para o filho para avisar que Edward está no hospital. E então Will e sua esposa grávida, Josephine (Marion Cotillard), partem para a casa dos pais dele. Ao longo da projeção de “Peixe Grande” é contada todas as situações fabulosas vividas por um Edward jovem (Ewan McGregor). Aliás, Ewan McGregor encontra o tom certo para o personagem e assim as histórias incríveis idealizadas por Burton funcionam na tela. Ewan nos apresenta o universo onírico engendrado por Edward, com direito a pântanos, bruxarias, circos, assaltos, guerras etc. De volta ao convívio com seu pai, Will aos poucos começa a perceber que o julgara errado. Talvez suas histórias realmente tenham um fundo de verdade e representem a identidade de Edward. Agora com um olhar mais atento para o pai, Will é transformado pela aproximação com ele. A ponto de ser o condutor do destino final desta fábula, criando seu próprio desfecho fantástico para a morte de Edward. Assim como teria sido toda a trajetória de seu pai. Edward Bloom procurava levar a vida de maneira mais divertida e agradável. O cotidiano muitas vezes é sem graça e podemos encontrar a magia que está ao redor de nossa existência, basta querer enxergar.


Por Gabriel Von Borell





Ficha Técnica
Título Original: Big Fish
Gênero: Comédia
Tempo de Duração: 125 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2003
Site Oficial: www.sonypictures.com/movies/bigfish/index.html
Estúdio: Columbia Pictures Corporation / The Zanuck Company / Jinks/Cohen Company
Distribuição: Columbia Pictures / Sony Pictures Entertainment
Direção: Tim Burton
Roteiro: John August, baseado em livro de Daniel Wallace
Produção: Bruce Cohen e Dan Jinks
Música: Danny Elfman
Fotografia: Philippe Rousselot
Desenho de Produção: Dennis Gassner
Direção de Arte: Roy Barnes, Robert Fechtman, Jack Johnston e Richard L. Johnston
Figurino: Colleen Atwood
Edição: Chis Lebenzon
Efeitos Especiais: Sony Pictures Imageworks / Stan Winston Studio / The Moving Picture Company


Elenco
Albert Finney (Ed Bloom)
Ewan McGregor (Ed Bloom - jovem)
Billy Crudup (Will Bloom)
Jessica Lange (Sandra Bloom)
Alison Lohman (Sandra Bloom - jovem)
Helena Bonham Carter (Jenny / Bruxa)
Robert Guillaume (Dr. Bennett)
Marion Cotillard (Josephine)
Matthew McGrory (Karl)
David Denman (Don Price - 18 aos 22 anos)
Missi Pyle (Mildred)
Loudon Wainwright III (Beamen)
Ada Tai (Ping)
Arlene Tai (Jing)
Steve Buscemi (Norther Winslow)
Danny DeVito (Amos Calloway)
Deep Roy (Sr. Soggybottom)
Perry Walston (Ed Bloom - 10 anos)
Hailey Anne Nelson (Jenny - 8 anos)
Grayson Stone (Will Bloom - 6 aos 8 anos)

domingo, 31 de maio de 2009

"Margot e o Casamento"


O diretor do elogiado “A Lula e a Baleia” (The Squid and the Whale, 2005), Noah Baumbach, volta à cena com seu trabalho mais ousado em “Margot e o Casamento” (Margot at the Wedding, 2007). E traz Nicole Kidman e Jennifer Jason Leigh em uma das maiores interpretações da carreira das duas atrizes. A química entre elas é perfeita e imediata, criando momentos memoráveis em cena. Noah Baumbach também nos dá a chance de descobrir que Jack Black é de fato um grande ator, provando que pode interpretar personagens mais densos e sérios. Isto sem perder sua veia cômica a pedido de Baumbach. Com um roteiro primoroso, o diretor apresenta um filme sobre a sinceridade nas relações humanas. Baumbach esmiuça os defeitos que todo ser humano tem e os conflitos que os mesmos podem gerar. Na trama, todos os personagens são extremamente francos, quase cruéis em alguns momentos. E ninguém escapa da mira da sinceridade justamente porque todos têm sua carga de imperfeição e complexidade. “Margot e o Casamento” é um longa sobre a dificuldade das pessoas em se relacionar com o próximo. Neste caso o enredo gira em um contexto familiar. A dose de humanidade é tão característica no filme que em alguma hora você se identifica com algum personagem, mesmo que não seja por uma medida muito nobre. É um confronto constante com a realidade. Com aquilo que queremos e não queremos enxergar no próximo. As pessoas podem ser tão íntimas e ao mesmo tempo tão estranhas uma das outras. Podemos dividir vivências, compartilhar segredos, participar de muitas situações com aqueles que amamos. E ainda assim nos sentir como se não conhecêssemos aquela pessoa em determinados momentos, a ponto de não poder delimitar até onde vai o amor ou ódio. Ou até mesmo, a verdade e a mentira. E tudo isto é sentido pelo público. O diretor americano mostra o quanto a verdade incomoda, fere, machuca. Mas talvez seja necessário para construir um relacionamento sólido. O filme se inicia no meio da ação, com uma narrativa não linear que dá o tom de “Margot e o Casamento”. Como o filme está sempre se movendo, o espectador sente como se estivesse vivendo com aquelas pessoas, participando daquelas situações. As tomadas longas de Baumbach aliada aos movimentos de sua câmera geram uma dose de realismo gigantesca. A escalação de um excelente elenco também ajuda. Margot (Nicole Kidman), viaja com seu filho, Claude (Zane Pais), até a casa de sua família para o casamento da sua irmã, Pauline (Jennifer Jason Leigh). As duas não se falam há bastante tempo, mas Margot acha a sua presença e de Claude importante para apoiar a irmã neste momento. Quando Margot conhece o futuro marido de Pauline, Malcolm (Jack Black), de imediato surge o primeiro problema. Ela não entende como Pauline pode se casar com um sujeito de aparência desleixada, sem trabalho, que é músico frustrado e passa seu tempo escrevendo cartas para jornais e revistas. Margot é impiedosa e critica a todos desde a sua chegada. Ela não poupa ninguém. A personagem de Nicole Kidman domina e controla as ações e é a figura que busca expor os relacionamentos familiares dentro do filme. Enquanto Pauline está prestes a se casar, o casamento de Margot com Jim (John Turturro) está ruindo e seu retorno à cidade onde cresceu a leva a manter um caso com Dick (Ciarán Hinds). Margot procura expor os defeitos nos outros para disfarçar seus próprios defeitos. Claude não foge muito ao exemplo da mãe em alguns momentos da história. Ele é um garoto incompreendido muitas vezes e busca o tempo todo a aprovação da mãe, que parece estar alheia aos problemas do filho. Pauline é o completo oposto da irmã. Ela é uma mulher doce e insegura, que durante toda sua vida também buscou a aprovação de Margot para tudo que fazia. Embora pareça fria, Margot se culpa por ser como ela é. Enquanto Pauline se irrita por se preocupar tanto com o julgamento da irmã. Convivendo juntas novamente, as duas tentam acertar os ponteiros e recuperar a cumplicidade e companheirismo de outrora. As relações em “Margot e o Casamento” são bem intensas e deixam marcas profundas. A melancolia constrói o clima do filme e um humor ácido e devastador está sempre presente nos diálogos. Os personagens parecem ter uma vontade enorme de gritar, de extravasar suas angústias que durante muito tempo ficaram reprimidas. Como em uma das primeiras cenas, quando Claude vai até o local que separa os vagões do trem e começa a gritar até sentir que colocou tudo para fora. Aliás, o garoto Zane Pais é uma grande revelação. Dividiu a cena com Nicole Kidman de forma admirável. O final de “Margot e o Casamento” é simples e bonito. Como se Noah Baumbach estivesse encerrando um capítulo de uma história que ainda tem muito para contar. Assim como acontece na vida de todos nós.


Por Gabriel Von Borell




Margot e o Casamento
(Margot at the Wedding, Estados Unidos, 2007)
Direção: Noah Baumbach Roteiro: Noah Baumbach Elenco: Nicole Kidman, Jennifer Jason Leigh, Jack Black, Zane Pais
. Drama. 92 min.

sábado, 23 de maio de 2009

"300"


O cineasta americano Zack Snyder já havia provado seu talento quando refilmou o clássico do terror “Madrugada dos Mortos” (Dawn of the Dead, 2004), mas é com “300” (300, 2007) que Snyder se consagra como um grande diretor. Classificado por muitos como um “neo-épico”, “300” é diferente de todas as grandes histórias contadas no cinema moderno. O filme é uma adaptação da HQ de Frank Miller “300 de Esparta” e tem seus maiores méritos nos efeitos permitidos pela computação gráfica. É como se a história fosse tirada dos quadrinhos e arremessada para a telona. Prova maior da qualidade do longa de Snyder, que domina os recursos estilísticos com muito bom gosto. “300” abusa das cenas em câmera lenta, ou acelerada. De vez em quando também lança uma sequência de forma pausada. Provavelmente a experiência do diretor com videoclipes deve ter ajudado a compor uma arte gráfica tão eficiente. Os embates mostrados no filme são extremamente coreogrados, como um balé em meio a muito sangue e violência. Todos estes elementos reunidos resultam em uma edição bem eletrizante e deixa o espectador ligado na trama. Gerard Butler mostra que é um dos grandes atores da nova geração numa interpretação impressionante. Já Rodrigo Santoro dá vida a um vilão com voz e tamanho alterados digitalmente. Seu personagem é coberto por jóias e piercings, e Santoro tem uma performance muito consistente. “300” conta a batalha de Termópilas, quando 300 soldados de Esparta, liderados por seu rei Leônidas (Gerard Butler), junto de alguns poucos gregos livres enfrentam o enorme exército persa. Xerxes (Rodrigo Santoro) é o Imperador-Deus da Pérsia que pretende dominar a Grécia Antiga. O rei Leônidas desobedece a ordem dos oráculos e parte para a batalha, deixando sua mulher, a rainha Gorgo (Lena Headey) e seu filho para trás. As lutas são sangrentas e, embora com um contigente infinitamente menor, os espartanos conseguem deter o avanço dos persas com muita bravura e união. Xerxes é um poço de vaidade e se considera uma verdadeira divindade. O imperador tenta convencer Leônidas a se curvar diante da sua imponência, mas o rei de Esparta busca a vitória a qualquer custo, mesmo que esta não chegue. O mais importante é defender seu povo acima de tudo, nem que para isto seu exército tenha que sangrar até a morte. Enquanto isso, sua rainha Gorgo busca convencer os governates da cidade-estado a enviar reforços para ajudar os espartanos na guerra. Ela acaba se envolvendo numa trama política já que o cruel Theron (Dominic West) pretende atrapalhar seus planos. “300” revoluciona o gênero épico e isto já vale como destaque, e muito.


Por Gabriel Von Borell




Ficha Técnica
Título Original: 300
Gênero: Aventura
Tempo de Duração: 117 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2007
Site Oficial: wwws.br.warnerbros.com/300
Estúdio: Warner Bros Pictures / Virtual Studios / Legendary Pictures / Hollywood Gang Productions / Atmosphere Entertainment MM
Distribuição: Warner Bros
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Kurt Johnstad, Zach Snyder e Michael Gordon, baseado em graphic novel de Frank Miller e Lynn Varley
Produção: Mark Canton, Bernie Goldman, Gianni Nunnari e Jeffrey Silver
Música: Tyler Bates
Fotografia: Larry Fong
Desenho de Produção: James D. Bissell
Direção de Arte: Isabelle Guay, Nicolas Lepage e Jean-Pierre Paquet
Figurino: Michael Wilkinson
Edição: William Hoy
Efeitos Especiais: Animal Logic / Lola Visual Effects / Spectral Motion Inc. / Buzz Image Group / Hydraulx / Meteor Studios / Pixel Magic / CA Scanline Production GmbH / Gentle Giant Studios Inc. / Hybride Technologies / Screaming Death Monkey


Elenco
Gerard Butler (Rei Leônidas)
Lena Headey (Rainha Gorgo)
David Wenham (Dilios)
Dominic West (Theron)
Vincent Regan (Capitão)
Michael Fassbender (Stelios)
Rodrigo Santoro (Xerxes)
Andrew Tiernan (Ephialtes)
Andrew Pleavin (Daxos)
Tim Connolly (Pai de Leônidas)
Marie-Julie Rivest (Mãe de Leônidas)
Tyler Max Neitzel (Leônidas - 12 anos)
Tyrone Benskin (Emissário persa)