terça-feira, 28 de dezembro de 2010

"Os Sonhadores"

Polêmico e provocador. Esta poderia facilmente ser uma visão analítica sobre “Os Sonhadores” (The Dreamers, 2003) de Bernardo Bertolucci, baseado no romance de Gilbert Adair, “The Holy Innocents”, de 1988. Mas o belo filme do cineasta italiano é bem mais que a junção destes dois conceitos. É uma homenagem ao cinema e à cultura em geral.  Sem deixar de ser também uma obra inspiradora sobre o espírito revolucionário dos jovens e sobre os movimentos estudantis. “Os Sonhadores” conta a história de três jovens que se conhecem durante o conturbado cenário político da Paris do final dos anos 60. A Cinemateca de Paris, ponto de encontro de jovens cinéfilos, é muito freqüentada pelo americano Matthew (Michael Pitt). Sempre sozinho, o estudante costuma ir ao local para assistir aos clássicos da história do cinema mundial. Quando o diretor e fundador da Cinemateca, Henri Langlois, é demitido, passeatas e manifestações são organizadas em protesto. É aí que Matthew conhece os irmãos gêmeos Theo (Louis Garrel) e Isabelle (Eva Green). De um cotidiano solitário, o americano passa a dedicar seus dias à convivência com os dois irmãos. Quando os pais de Theo e Isabelle deixam a cidade para uma viagem de um mês, Matthew é convidado pelos dois para morar com eles durante aquele período. Neste processo, Matthew desenvolve um encantamento por Isabelle que trará descobertas que, em um primeiro momento, deixará o rapaz bastante incomodado. A relação incestuosa dos irmãos gêmeos perturba a cabeça de Matthew, que ainda assim não consegue se afastar de Theo e Isabelle diante de tanto fascínio pela atraente moça. As cenas de incesto, sexo, nudez e masturbação podem incomodar o espectador, mas Bertolucci conduz “Os Sonhadores” com uma sensibilidade que minimiza o choque da platéia, pelo menos daqueles menos provincianos. A cena em que Isabelle perde a virgindade com Matthew no chão da cozinha, enquanto Theo prepara ovos no fogão e lança olhares curiosos para cima dos dois, poderia parecer grotesca se não fosse pelo talento e apuro de Bertolucci. Em meio aos jogos sexuais e psicológicos estabelecidos pelo trio, o filme vai desfilando referências a famosas obras cinematográficas como “Bande à Part”, “A Vênus Loira” e “Rainha Cristina”. E também vai revelando uma trilha sonora incrível com menções a Janis Joplin, The Doors, Bob Dylan, Jimi Hendrix, Eric Clapton. Dentro do contexto político da França naquela época, Theo ensaia belos discursos, teoriza contra o sistema, mas não passa de um observador distante, quase alheio aos protestos que ocorrem do lado de fora da sua janela. Matthew é aquele que abre os olhos de Theo para a sua própria hipocrisia. E mostra ao irmão de Isabelle que suas palavras e suas ações não possuem coerência. Por outro lado, Theo provoca Matthew fazendo questão de mostrar que sua relação com a irmã é muito mais íntima do que Matthew gostaria que fosse. E assim os dois jovens travam uma batalha pela atenção da ninfeta. Esta, por sua vez, aparece sempre muito dependente do irmão. Embora a questão ideológica e política estejam sempre presente em “Os Sonhadores”, o apelo do trio de protagonistas pende muito para o narcisismo. Os atores têm uma extraordinária química em cena e fazem o triângulo amoroso funcionar bem. Destaque para Eva Green, com uma performance arrebatadora e marcante. “Os Sonhadores” é mais um filme sobre o romantismo sensual e menos uma história sobre depravação e libertinagem. Algumas pessoas podem até não gostar deste longa de Bertolucci, mas é impossível não repercutir sobre ele. Somente o burburinho já é um ponto para o italiano.


Por Gabriel Von Borell



Os Sonhadores
(The Dreamers, Reino Unido, França, Itália, 2003)
Direção: Bernardo Bertolucci Roteiro: Gilbert Adair
Elenco: Michael Pitt, Eva Green, Louis Garrel, Robin Renucci. Drama. 115 min.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

"Apenas Uma Vez"

Sucesso no circuito independente, o musical “Apenas Uma Vez” (Once, 2006), de John Carney, conquistou milhares de fãs por todo o mundo com suas belas e emocionantes canções. Todas as músicas foram compostas pelo músico irlandês Glen Hansard e pela tcheca Marketa Irglova, que hoje formam a dupla The Swell Season. O talento dos dois é tão grande que o filme arrebatou até a Academia do Oscar, que premiou o musical com o Oscar de Melhor Canção Original em 2008, pela linda “Falling Slowly”. A ideia para a construção do roteiro do filme surgiu durante um show do grupo The Frames, do qual Hansard era vocalista e em que Carney também já tocou baixo, entre 1991 e 1993. Então, em 2005, o diretor pediu a Hansard para que escrevesse músicas para uma história de amor que seria retratada no cinema. Como resultado, Carney e Hansard criaram dez canções originais e elaboraram um roteiro com mais de 50 páginas. Todo filmado no estilo documental, “Apenas Uma Vez” mantém seus personagens sempre bem próximos do espectador e isto ajuda a compor um clima intimista ao longo da projeção. Na trama, Hansard é um sujeito comum de Dublin, que trabalha com seu pai em uma loja que conserta aspiradores de pó. Nas horas vagas, ele se apresenta pelas ruas da cidade cantando e tocando o seu violão. E em uma destas performances, o músico conhece a personagem de Irglova, que já o observara muitas vezes enquanto vendia suas flores. Uma curiosidade sobre o filme é que os personagens não possuem nome. Quando ela (Irglova) resolve falar com ele (Hansard), os dois começam uma aproximação que resultará em uma parceria musical. O público pode até imaginar que aquilo vai terminar em alguma espécie de relacionamento amoroso, mas tudo fica mesmo no campo de uma incrível afinidade na música. À medida que os dias passam, a dupla vai se conhecendo e percebendo melhor um ao outro. E Carney mostra todo esse processo com bastante delicadeza e sensibilidade. A cena dentro da loja de instrumentos traduz perfeitamente a questão. Aquele momento captado pela câmera sintetiza o entrosamento entre o casal. Uma nota aqui, um acorde ali, e os dois demonstram uma sintonia imediata. “Apenas Uma Vez” foi rodado em 17 dias e os protagonistas deixaram claro antes mesmo do filme ficar pronto que aquela seria uma incursão única pelo cinema. Uma pena. Juntos, a dupla soube contar perfeitamente uma história singela, tocante, com letra e música encantadoras. Do jeito que poucos seriam capazes de fazer. No final das contas, “Apenas Uma Vez’ é um musical para ser visto e sentido.


Por Gabriel Von Borell




Apenas Uma Vez
(Once, Irlanda, 2006)
Direção: John Carney Roteiro: John Carney Elenco: Glen Hansard, Markéta Inglová, Hugh Walsh, Geoff Minogue
. Drama. 85 min.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

"O Sonho de Cassandra"

Em seu terceiro filme rodado em Londres, Woody Allen constrói mais uma história com traços de tragédia grega em “O Sonho de Cassandra” (Cassandra’s Dream, 2007). Mas não pense que isto é um aspecto negativo. O cineasta nova-iorquino joga com dilemas morais e envolve o espectador em uma trama sobre ambição, cobiça, dinheiro, culpa e arrependimento. Até onde o ser humano é capaz de chegar para levar uma vida confortável e bem-sucedida? E até que ponto conhecemos as pessoas ao nosso redor? Allen parece que gosta de trabalhar com a consciência humana e isto já é, no mínimo, interessante. “O Sonho de Cassandra” conta a história de dois irmãos: Ian (Ewan McGregor) e Terry (Colin Farrell). O primeiro é extremamente ambicioso e sonha em entrar no mercado de hotelaria e levar uma vida cheia de luxos. O último é menos pretensioso, embora viva apostando em corridas de cavalos e tentando faturar sempre uma grana cada vez maior. Juntos, os dois compram um barco com suas economias e batizam o mesmo como O Sonho de Cassandra, em uma referência ao mito de Cassandra, quando uma mulher recebeu o dom de prever o futuro ao mesmo tempo em que recebeu o castigo de que ninguém acreditaria em suas previsões. Tudo vai bem até o momento em que Terry se vê devendo uma grana alta a um agiota, que faz todos os tipos de ameaça. É quando ele procura Ian para que os dois possam pensar em uma solução para o problema. Para a sorte, ou azar, dos irmãos, seu tio Howard (Tom Wilkinson) está vindo visitar a família depois de um longo período sem vê-los. O tio ausente construiu uma verdadeira fortuna com o exercício da medicina e talvez ele não se importe em quitar a dívida de Terry. De quebra, o tio ainda tranqüilizaria seu outro sobrinho, Ian, que está preocupado com o irmão. Porém, o que nem Terry nem Ian sabe é que na verdade a visita de Howard tem um motivo sórdido por trás. No melhor estilo uma mão lava a outra, o tio apresenta uma proposta aos irmãos: os dois vão ter a grana para pagar o agiota desde que assassinem um ex-sócio de Howard que vem o chantageando. Esta é a condição do tio milionário para fechar o negócio. Neste momento, “O Sonho de Cassandra” mergulha profundamente na questão moral e obriga o espectador a julgar todas as ações daqueles personagens. Não seria equivocado afirmar que, em algum momento da projeção, o espectador chega a se colocar no lugar de um dos irmãos e se perguntar o que faria se passasse pela mesma situação. O problema é que a conclusão desta troca de favores ingrata vai gerar conseqüências antes não cogitadas. É aí que o filme de Woody Allen ganha contornos ainda mais dramáticos. O que fazer quando uma das partes responsável por um crime não consegue lidar com o remorso e a culpa? Ian aparentemente não se martiriza pelo que fez a mando de Howard. Pelo contrário. Ele planeja um grande futuro ao lado de Angela Stark (Hayley Atwell), uma atriz de teatro tão ambiciosa quanto Ian. Já Terry começa a preocupar sua esposa Kate (Sally Hawkins), que passa a suspeitar que seu marido esteja enlouquecendo. Então Kate recorre a Ian para encontrar alguma forma de ajudar Terry a superar seja lá o que ele esteja passando. A coisa fica ainda mais perigosa quando Terry revela ao irmão que pretende confessar o assassinato às autoridades policiais. Sem saber como proceder, Ian procura o tio Howard para falar sobre a situação. E este dá ao sobrinho uma solução completamente perturbadora, que pode tomar um rumo irreversível. E assim “O Sonho de Cassandra” tem seu desfecho de forma bem shakesperiana, em um filme marcado com a melhor atuação da carreira de Colin Farrell.


Por Gabriel Von Borell



ficha técnica:

título original:Cassandra's Dream
gênero:Drama
duração:01 hs 48 min
ano de lançamento:2007
estúdio:Iberville Productions / Virtual Studios / Wild Bunch
distribuidora:The Weinstein Company / Imagem Filmes
direção: Woody Allen
roteiro:Woody Allen
produção:Letty Aronson, Stephen Tenenbaum e Gareth Wiley
música:Philip Glass
fotografia:Vilmos Zsigmond
direção de arte:
figurino:Jill Taylor
edição:Alisa Lepselter

elenco:

Ewan McGregor (Ian)
Colin Farrell (Terry)
John Benfield (Pai)
Clare Higgins (Mãe)
Ashley Madekwe (Lucy)
Andrew Howard (Jerry)
Tom Wilkinson (Howard)
Philip Davis (Martin Burns)
Hayley Atwell (Angela Stark)
Sally Hawkins (Kate)
Stephen Noonan (Mel)
Dan Carter (Fred)
Jennifer Higham (Helen)
Lee Whitlock (Mike)
Milo Bodrozic (Milo Bodrozic)
Emily Gilchrist (Emily Gilchrist)
Richard Lintern (Diretor)
Peter-Hugo Daly (Dono do barco)

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

"Invictus"

A primeira cena de “Invictus” (Invictus, 2009) é bastante emblemática e serve como premissa para todo o desenrolar do filme. O veterano diretor Clint Eastwood mostra duas faces distintas de uma África do Sul dividida pelo Apartheid: de um lado aparecem jovens brancos treinando rugby, do outro a câmera mostra crianças negras jogando futebol. Entre estes dois universos aparentemente intransponíveis, surge a comitiva de Nelson Mandela (Morgan Freeman), comemorando a sua libertação depois de 27 anos de prisão. A data era 1990 e quatro anos depois, Mandela viria a se tornar presidente daquela nação. Buscando soluções para possibilitar uma unificação de seu povo, que ainda carregava os resquícios de uma segregação racial gerada pelo Apartheid, Mandela encontra no esporte, mais especificamente na prática do rugby, a resposta para juntar negros e brancos, e assim construir uma África do Sul justa e próspera, sem distinção de nenhum tipo. A relação pouco amistosa entre os membros da equipe de segurança de Mandela ilustra bem a tensão racial que o país emanava naquela época.  Porém, o presidente da África do Sul acreditava que o campeonato mundial de rugby que estava prestes a ser sediado em seu país poderia acabar com o abismo que separava brancos e negros. O problema é que a equipe de rugby da África do Sul era considerada muito fraca e as chances de conquistar o campeonato eram bem remotas. Sem contar que a maioria do povo, negra, odiava o “esporte de branco”, chegando até a torcer contra a equipe de rugby da África do Sul. A idéia de Mandela em usar a Copa do Mundo para aproximar negros e brancos parecia então absurda, inclusive para sua equipe de governo. Porém, Mandela passou a contar com o capitão do time, François Pienaar (Matt Damon), para ajudá-lo nesta árdua tarefa. O objetivo do líder político africano é encorajar seus jogadores para que os mesmos busquem dentro de si um espírito de luta e garra, capaz de torná-los campeões, contrariando todas as expectativas. François executa seu trabalho exatamente como Mandela esperava e a África do Sul chega às finais do campeonato mundial com reais possibilidades de sagrar-se campeã. O jogo final é uma verdadeira batalha campal e Eastwood é mestre na arte de envolver e emocionar o espectador. Não é preciso entender as regras do jogo para entrar no clima “de vida ou morte” da história. Quem assiste percebe que aquele momento transcende o conceito de ganhar ou perder. Não é apenas um jogo, é o primeiro passo na direção de um entendimento entre negros e brancos. A dedicação de François, dentro de campo, e Mandela, fora dele, é compreendida em um grau muito forte pelo espectador. O diretor usa a câmera lenta e o som com um domínio incrível e o espectador testemunha a grande expectativa de um povo, dentro e fora do estádio. Dá até para comparar com o que acontece no Brasil em tempos de Copa do Mundo de Futebol. A maturidade criativa de um inteligente diretor como Eastwood é a peça-chave para o sucesso de “Invictus”. É preciso mencionar também a interpretação memorável de Morgan Freeman como o líder africano. Não seria impossível, por exemplo, confundir o ator com o próprio Mandela em um momento mais distraído. “Invictus” é um longa muito mais a partir do Apartheid do que sobre ele.  Outra obra notável para o currículo de um cineasta que se mostra em plena forma aos 80 anos.


Por Gabriel Von Borell



Invictus
(Invictus, Estados Unidos, 2009)
Direção: Clint Eastwood Roteiro: Anthony Peckham Elenco: Morgan Freeman, Matt Damon, Tony Kgoroge, Patrick Mofokeng
. Drama. 134 min.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"Rocknrolla"

“Rocknrolla – A Grande Roubada” (Rocknrolla, 2007), do diretor Guy Ritchie, é um daqueles filmes para não ser levado a sério. Para curtir o longa, o espectador tem que estar comprometido apenas com as boas piadas e diálogos espirituosos, esquecendo assim bastante o roteiro, que não é lá grande coisa. Feito isso: a diversão é garantida. Ritchie resgata o estilo narrativo que lhe deu fama com o excelente “Jogos, Trapaças e dois Canos Fumegantes” (Lock, Stock and two Smoking Barrels, 1998) e cria uma história recheada de confusões que envolvem o submundo do crime em Londres. Desta vez, o diretor não se mostrou tão inspirado quanto em seu filme de estréia, mas “Rocknrolla” não é nem de longe um filme descartável. O pano de fundo da história mostra o domínio da máfia russa sobre o futebol inglês, o que vai atrair o encontro de vários tipos de bandido: de chefões da máfia até vigaristas fajutos, numa grande rede de trapaças e confusões. Com narração em off, Ritchie apresenta a hierarquia deste submundo londrino de modo que o espectador não se perca dentre tantos tipos de criminosos diferentes. As situações mais engraçadas são vividas pelo trio One Two (Gerard Butler), Mumbles (Idris Elba) e Handsome Bob (Tom Hardy). Juntos, eles foram enganados pelo maior mafioso da região, Lenny Cole (Tom Wilkinson), e seu braço direito Archie (Mark Strong), e agora precisam arrumar um jeito para levantar uma alta grana e pagar o que devem a Cole, antes que o bam-bam-bam da área corte a cabeça deles. Para se safar, o trio aceita trabalhar para Stella (Thandie Newton), contadora de confiança de um grande mafioso russo que veio para Londres atraído pela expansão imobiliária que eclodiu nos últimos anos na Inglaterra. Stella contrata One Two e Cia para assaltar o russo quando este for levar o dinheiro de um negócio que havia acertado com Cole. Por outro lado, o chefão da máfia de Londres também se vê em maus lençóis quando o quadro de estimação dado pelo russo como garantia da sociedade selada entre os dois some. Tranqüilo, achando que terá tempo para encontrar a pintura a óleo antes da conclusão do acordo com o russo, Cole se torna mais um a ter que se “virar” quando o chefão da Rússia pede para ter de volta o objeto. A partir daí, Cole entra numa busca incessante pelo quadro a fim de que o russo não descubra que um dia a pintura desapareceu. Enquanto isso, os milhões que selariam a sociedade entre os dois chefões vão parar nas mãos de Stella e One Two, que acabam levando a grana não somente na primeira, mas nas duas vezes que o russo transporta o dinheiro para Cole. Aí já dá para perceber como as histórias vão se cruzar e é hilário acompanhar como se estabelece o clima de paranóia e desconfiança entre Cole e o russo. É claro que um fica achando que o outro está querendo lhe passar para trás, quando na verdade ambos são vítimas de golpes de terceiros. Ainda entra na história Johnny Quid (Toby Kebbell), que acaba se tornando a personificação do verdadeiro “rocknrolla”. Quid aparece como suspeito de estar com o requisitado quadro, mas pelo fato de ser considerado um roqueiro morto, a caçada de Cole para reaver a pintura se torna mais complicada. Para amarrar ainda mais a relação entre os personagens, Quid vem a ser enteado e grande desafeto do próprio Cole. Guy Ritchie constrói sua trama com um ritmo eletrizante e bastante adrenalina. O diretor lança mão dos recursos visuais para tornar seu filme mais bacana. As tomadas em slow motion e depois aceleradas, assim como os cortes videoclípticos, conferem um conceito bem cool a “Rocknrolla”. A trilha sonora, incrivelmente bem casada com as cenas, também ajuda a tornar o filme mais interessante. A La Tarantino, mas sem o mesmo talento e inspiração, Ritchie realiza um filme mais de comédia do que sobre a máfia propriamente dita. Se o espectador for assistir “Rocknrolla” com o propósito de conferir um longa sobre corrupção e máfia vai se decepcionar. Agora se o objetivo é se divertir e dar boas risadas, este é um prato cheio.


Por Gabriel Von Borell



ficha técnica:

título original:RocknRolla
gênero:Ação
duração:01 hs 54 min
ano de lançamento:2008
estúdio:Dark Castle Entertainment / Toff Guy Films
distribuidora:Warner Bros.
direção: Guy Ritchie
roteiro:Guy Ritchie
produção:Steve Clark-Hall, Susan Downey, Joel Silver e Guy Ritchie
música:Steve Isles
fotografia:David Higgs
direção de arte:Neal Callow e Andy Nicholson
figurino:Suzie Harman
edição:James Herbert
efeitos especiais:Rushes Post Production

elenco:

Gerard Butler (One Two)
Tom Wilkinson (Lenny Cole)
Thandie Newton (Stella)
Mark Strong (Archie)
Idris Elba (Mumbles)
Jeremy Piven (Mickey)
Blake Ritson (Johnny Sloane)
Karel Roden (Uri Omovich)
Bronson Webb (Paul)
Michael Ryan (Pete)
Tom Hardy (Handsome Bob)
Matt King (Cookie)
Toby Kebbell (Johnny Quid)
David Leon (Malcolm)
Dragan Micanovic (Victor)
Riffany Mulheron (Jackie)
Ludacris (Roman)
Nonso Anozie (Tank)
David Bark-Jones (Bertie)
Gemma Arterton (June)
Geoff Bell (Fred)
Morne Botes (Jimmy)


quinta-feira, 5 de agosto de 2010

"Vidas que se Cruzam"

A estreia na direção do roteirista Guillermo Arriaga (famoso pela parceria com o diretor Alejandro González Iñárritu em “21 Gramas” e “Babel”) com “Vidas que se Cruzam (The Burning Plain, 2009) mostrou mais uma vez o seu talento na construção de uma boa história e provou que Arriaga pode avançar além dos roteiros. Embora o diretor estreante tenha cometido algumas pequenas falhas, que Iñárritu provavelmente não cometeria, ao longo da projeção, nada pode apagar o brilhantismo da sua história. Arriaga errou ao não dar o aprofundamento necessário aos personagens de seu primeiro filme, principalmente com relação ao papel de Charlize Theron. Mas não tem problema, o agora diretor/roteirista continua sabendo perfeitamente prender a atenção do espectador e é mestre na arte de fazê-lo mergulhar na história a fim de desvendar o drama por trás de toda aquela melancolia e dor. “Vidas que se Cruzam” é perturbador em muitos sentidos e mostra como nossos equívocos podem trazer terríveis conseqüências por toda a vida. O estilo de filmagem segue a mesma cartilha de seus trabalhos anteriores como roteirista. Em sua estreia como diretor, Arriaga também utiliza o recurso de contar a trama por meio de diversas narrativas que são intercaladas e ordenadas de modo admirável. Não tem jeito, esta forma de direção já virou marca de Arriaga/Iñárritu e os dois usam o modelo a seu favor como ninguém. A diferença é que, se antes o roteiro de Arriaga focava em histórias que aconteciam paralelamente, desta vez o roteirista optou por uma narrativa que percorre tempos diferentes. Ora o longa revela situações do passado, ora apresenta cenas do presente. Aqui, as atuações não se destacam tanto quanto poderiam, muito pelo fato, já antes citado, do diretor não ter trabalhado tão bem a construção dos personagens centrais. Ainda que Kim Basinger tenha protagonizado uma cena memorável quando a personagem da atriz é tocada em seu seio esquerdo dilacerado pelo câncer. “Vidas que se Cruzam” começa com a imagem de um trailer em chamas em uma cidade próxima à fronteira do México. Logo em seguida a câmera viaja para Portland, EUA, onde Sylvia (Charlize Theron) acorda depois de ter dormido com um homem que, aparentemente, ela não conhecia. Depois, a moça segue para o trabalho enquanto seus passos são meticulosamente observados por um homem estranho (José Maria Yazpik). Sylvia trabalha em um restaurante perto do mar e logo o espectador descobre que o cara com quem a moça acabara de dormir é John (John Corbett), um cozinheiro do mesmo restaurante. Sylvia parece ser uma pessoa bastante atormentada e se autoflagela constantemente, deixando seu corpo todo marcado por feridas. Como se não bastasse a mutilação física, Sylvia vai para cama com qualquer homem que demonstre o mínimo de interesse por ela e depois o dispensa, afastando todos que queiram algum tipo de aproximação em um nível superior, como é o caso de John. Na segunda narrativa, o filme mostra três garotos mexendo nos destroços do trailer incendiado que foi mostrado no início. Dois deles são filhos do homem que estava lá dentro com uma mulher que não era a mãe deles. Santiago (J.D. Pardo) é aquele que se mostra mais afetado pela morte do pai e vai procurar saber de onde veio a mulher com quem ele estava tendo um caso e quem sua amante havia deixado para trás. É quando uma terceira história é apresentada onde uma menina chamada Maria (Tessa Ia) acompanha o pai (Danny Pino) em sua jornada de sobrevoar plantações para irrigar os terrenos. Inicialmente, pode parecer confuso se situar dentro da trama, mas aos poucos Arriaga vai ligando os pontos e as conexões entre uma narrativa e outra. Assim o espectador vai percebendo com clareza a história. O público logo descobre, por exemplo, o amor proibido entre a americana Gina (Kim Basinger) e o mexicano Nick (Joaquim de Almeida). Eles formam a dupla de infiéis mortos no incêndio do trailer. Durante um bom tempo, o espectador se pergunta sobre qual seria o motivo para uma mulher como Gina, que tinha uma boa casa, bonita família e dinheiro, procurar os braços de um homem simples e bronco como Nick. Na verdade, Gina era uma mulher que procurava bem mais do que simplesmente sexo. Ela procurava o carinho e o afeto que não tinha mais em casa desde que retirou os seios em decorrência de um câncer de mama e passou a ser evitada pelo marido Robert (Brett Cullen). Por outro lado, Nick não se incomodava com aquilo, ele amava Gina da maneira como ela era. O mexicano via a beleza em seu corpo que seu marido não conseguia enxergar. A cena em que Robert tenta fazer sexo com Gina e não consegue deixa isto bem evidente. Mas quem vai atrapalhar de verdade, e até de certa maneira em definitivo, a história entre Gina e Nick é a filha dela Mariana (Jennifer Lawrence). A menina, inclusive, começa a namorar Santiago depois que os dois, juntos, após perderem os pais, tentam entender melhor o relacionamento extra-conjugal e acabam se apaixonando no meio do processo. O mais interessante de “Vidas que se Cruzam” é acompanhar como aqueles enredos, aparentemente sem nenhuma relação, de fato se entrecruzam e como isto permite ao espectador compreender por que cada personagem fez o que fez. Suas motivações, seus medos, seus anseios, seus fantasmas, são como são por algum motivo bem específico e particular. Um equívoco pode mudar o destino de muitas pessoas drasticamente. As cicatrizes emocionais são como feridas abertas que nunca se curam. Não adianta tentar fugir porque elas vão sempre te perseguir. Porém, por mais que o passado tenha sido terrível nada impede que o futuro seja promissor. E tomara que Arriaga se aventure novamente na direção. Com a experiência, o roteirista pode fazer ainda melhor.


Por Gabriel Von Borell



ficha técnica:
título original:The Burning Plain
gênero:Drama
duração:01 hs 47 min
ano de lançamento:2009
site oficial:http://www.burningplainmovie.com
estúdio:2929 Productions / Costa Films / Parkes/MacDonald Productions
distribuidora:Magnolia Pictures / Paris Filmes
direção: Guillermo Arriaga
roteiro:Guillermo Arriaga
produção:Laurie MacDonald e Walter F. Parkes
música:Omar Rodriguez-Lopez e Hans Zimmer
fotografia:Robert Elswit e John Toll
direção de arte:James Donahue e Naython Vane
figurino:Cindy Evans
edição:Craig Wood
efeitos especiais:Ollin Studio / Animal Makers

elenco:
Charlize Theron (Sylvia)
Kim Basinger (Gina)
Jennifer Lawrence (Mariana)
José Maria Yazpik (Carlos)
Joaquim de Almeida (Nick)
Tessa Ia (Maria)
Diego J. Torres (Cristobal)
J.D. Pardo (Santiago - jovem)
Danny Pino (Santiago)
John Corbett (John)
Brett Cullen (Robert)
Anthony Escobar (Padre)
Gray Eubank (Lawrence)
Rafael Hernández (Dr. Armendariz)
Sean McGrath (Scott)

quinta-feira, 29 de julho de 2010

"Um Sonho Possível"

“Um Sonho Possível” (The Blind Side, 2009), que inicialmente receberia o título de “O Lado Cego” (sua tradução literal), começa explicando um termo característico do futebol americano que servirá de premissa para toda a sequência da história. Narrada pela protagonista da trama Leigh Anne Tuohy (Sandra Bullock), a primeira cena do filme mostra uma sucessão de imagens de futebol americano aliada ao discurso de Leigh Anne, que tem o objetivo de explicar como o termo “lado cego” se aplica ao esporte em questão. Ela diz que quando um quarterback destro (uma das posições do futebol americano) se prepara para passar a bola, seu lado esquerdo deve ser protegido por um companheiro de equipe. A função deste outro jogador seria bloquear o adversário para que o quarterback pudesse fazer a jogada sem que ele fosse surpreendido pelo oponente através da região que está fora de seu campo de visão. Este é o ponto de partida para a compreensão de toda história. É a metáfora que permeará “Um Sonho Possível” do início ao fim. Baseado em um livro de Michael Lewis, o longa conta a história verídica de Michael Oher (Quinton Aaron), que hoje é um jogador famoso que atua pelos Baltimore Ravens. Oher é um garoto negro, pobre e grande demais a ponto de parecer esquisito. Conhecido como “Big Mike”, ele não conhece o pai e foi abandonado por sua mãe, viciada em drogas, quando criança. O jovem passou a vida pulando de um lar adotivo para outro, sem nunca estabelecer uma moradia fixa. Até o momento em que “Big Mike” é levado para uma escola frequentada pela classe média e alta da região. De imediato todos que trabalham na escola se mostram pouco receptivos à admissão do garoto na instituição. Principalmente pelas suas notas escolares extremamente baixas. Porém, com muito esforço, o técnico Burt Cotton (Ray McKinnon), convence a todos que o enorme potencial esportivo de “Big Mike” já seria um grande motivo para sua admissão. Uma vez aceito, o garoto passa a experimentar um mundo que nunca foi dele. Em uma noite fria e chuvosa, “Big Mike” é encontrado na estrada por Leigh Anne e sua família. Como Oher não tinha para onde ir, a moça acaba o levando para passar a noite em sua casa. A visão otimista do diretor e roteirista John Lee Hancock pode parecer exagerada em alguns momentos de “Um Sonho Possível”, mas o cineasta deixa claro em determinados momentos do filme que o altruísmo, neste caso representado pela personagem de Sandra Bullock, é uma iniciativa muito complicada à medida que tomamos conhecimento dos perigos do mundo atual e toda a maldade que um ser humano pode fazer. Até que ponto podemos confiar em um completo desconhecido? A cena em que Leigh Anne conversa na cama com seu marido Sean (Tim McGraw) logo depois de levarem “Big Mike” para casa ilustra bem a situação. Ela se pergunta se tomou a atitude correta enquanto ele responde que irão descobrir ao acordarem de manhã e darem falta de algum objeto da casa ou não. É uma questão interessante já que muitas pessoas ao nosso redor também se sentem amedrontadas ou receosas em ajudar o próximo visto que a maldade e a crueldade estão por todos os lugares. Para sorte de Leigh Anne, ela não corria esse risco com Oher. E ao acordar na manhã seguinte, por exemplo, “Big Mike”, já havia arrumado sua cama no sofá e estava quase no portão de saída da casa quando foi chamado por Leigh Anne, aos berros e passos corridos. A partir daí, Oher e sua tutora passam a construir uma bonita e deliciosa parceria de amizade, confiança e afeto. É muito gostoso perceber como, aos poucos, um vai transformando o universo do outro. A química entre Sandra Bullock e Quinton Aaron é incrível. A atuação de Bullock é um show à parte que foi recompensado com o Oscar de Melhor Atriz. Sua Leigh Anne é durona e doce na dosagem perfeita, nada caricatural. E com um leve toque de humor que a deixa irresistível. Previamente, o espectador pode pensar que Leigh Anne mudou mais a vida de Michael Oher do que o contrário. Mas como a própria Leigh Anne diz no filme, foi ela quem realmente foi transformada. “Big Mike” conquista o carinho de todos na família, não só dela e do marido, mas como dos dois filhos, o caçula SJ (Jae Head) e sua irmã mais velha Collins (Lily Collins). Com muito esforço e apoio da sua nova família, “Big Mike” vai progredindo gradativamente nos estudos e no futebol americano. O empenho de Oher faz com que apareça a oportunidade dele conseguir uma bolsa de estudos em algumas universidades dos Estados Unidos. E seu futuro promissor mobiliza toda a família, que inclusive contrata uma professora particular, Srta. Sue (Kathy Bates), para tornar as notas de Oher boas o suficiente para ele entrar na faculdade. “Um Sonho Possível” também não deixa de ser uma crítica ao conservadorismo norte-americano, como quando o casal Tuohy comenta que nunca haviam visto antes um cidadão democrata depois de contratarem a personagem de Kathy Bates para dar aulas a “Big Mike”. John Lee Hancock emociona de forma discreta, evitando qualquer pieguice. Sua direção, seu texto e suas cenas são muito bem pensados e montados. E seu maior mérito é ter dado um enfoque que de certa forma é inovador. Muitos filmes de caráter assistencial contam uma narrativa descrita pela ótica de quem é beneficiado pela ação, não sob o ponto de vista de quem executa a ação. Às vezes é preciso olhar um pouco o outro lado da história. Talvez sirva de exemplo para nós que acabamos mergulhando em nossa própria acomodação. “Um Sonho Possível” vai, no mínimo, te fazer repensar sobre suas ações e seus preconceitos.


Por Gabriel Von Borell





Um Sonho Possível
(The Blind Side, Estados Unidos, 2009)
Direção: John Lee Hancock Roteiro: John Lee Hancock Elenco: Sandra Bullock, Tim McGraw, Quinton Aaron, Kathy Bates
. Drama. 128 min.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

"Uma Prova de Amor"

Para chorar. Este parece ter sido o propósito do diretor Nick Cassavetes quando começou a elaborar o roteiro de “Uma Prova de Amor” (My Sister’s Keeper, 2009), baseado em um livro de Jodi Picoult. A exemplo do que Cassavetes já havia feito em “O Diário de uma Paixão” (The Notebook, 2004), o cineasta consegue emocionar o público de uma forma que poucas vezes foi vista no cinema. É praticamente impossível se manter alheio à história que é contada em tela. Por mais que o espectador resista, em algum momento vai derramar a sua lágrima. No quesito dramático, “Uma Prova de Amor” é devastadoramente eficiente. No aspecto técnico, Cassavetes talvez cometa algumas falhas, mas isto pouco importa quando o espectador já está completamente envolvido com a trama. O filme gira em torno de Anna Fitzgerald (Abigail Breslin), uma menina de 11 anos que veio ao mundo para salvar a vida de sua irmã mais velha Kate (Sofia Vassilieva), que tem leucemia e está muito perto da morte. Seus pais, Sara (Cameron Diaz) e Brian (Jason Patric), foram orientados a gerar Anna quando descobriram que nenhum parente, nem mesmo o irmão mais velho Jesse (Evan Ellingson), possuia medula compatível para salvar Kate, então com apenas dois anos. Anna foi projetada para nascer com todas as características necessárias para se tornar doadora. O problema é que isto gera um grande conflito na vida da filha mais nova do casal Fitzgerald. Anna se sente negligenciada já que imagina que apenas está viva pela necessidade de criar um meio de curar Kate. Por mais que Sara e Brian reforcem seu amor pela caçula, Anna no fundo questiona o grau de afetividade de seus pais. Afinal, ela sempre esteve em segundo plano. Bem ou mal, o câncer de Kate fez as atenções da família estarem a todo momento voltadas para ela. Desde que nasceu, Anna é submetida a procedimentos invasivos em seu corpo e por isto também vive no hospital. Sem saber se realmente quer continuar passando por todas estas etapas na tentativa de salvar a irmã, a caçula procura um famoso advogado, Campbell Alexander (Alec Baldwin). O objetivo de Anna é reclamar o direito com relação ao próprio corpo e para isto ela quer abrir processo contra os seus pais. Campbell inicialmente acha graça da história, mas depois aceita levar o caso ao tribunal por um motivo muito específico, que só é revelado ao espectador mais tarde. Os pais de Anna, claro, ficam desnorteados quando descobrem as intenções da filha mais nova. Não bastasse o fato de toda a família ter de lidar com a doença de Kate e toda a problemática que o câncer envolve, agora é hora de reavaliar decisões e considerar suas conseqüências. A juíza que vai tomar conta do caso, De Salvo (Joan Cusack), também vive um drama pessoal. Sua filha faleceu vítima de um acidente de carro e o caso dos Fitzgerald é seu primeiro depois de um longo período afastada dos tribunais por causa de sua tragédia pessoal. Mas a questão judicial fica apenas como um pano de fundo, o enfoque de “Uma Prova de Amor” é realmente mostrar como a doença afeta, de maneiras diferentes, as relações dentro de uma mesma família. E isto Cassavetes realiza com talento e habilidade. O diretor utiliza com muita sabedoria os recursos que tem a mão para emocionar a platéia. As sequências em câmera lenta, a trilha sonora delicada, as atuações sensíveis, tudo ajuda a fazer o espectador chorar, e muito. O elenco, aliás, dá um show a parte. Abigail Breslin, indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por “Pequena Miss Sunshine” (Little Miss Sunshine, 2006), prova que tem uma carreira promissora e que possui um enorme carisma. Sofia Vassilieva também não fica atrás. Apesar de inexperiente no cinema, a atriz não deixa a peteca cair e interpreta com bastante sensibilidade o papel mais difícil do longa. E Cameron Diaz surpreende em um papel mais complexo do que a estrela costuma representar em Hollywood. Diaz consegue imprimir a dramaticidade exata que a sua personagem exige. Até Jason Patric, que não é muito requisitado na trama, responde de forma positiva em cena. Cassavetes conta o drama da família Fitzgerald a partir do ponto de vista de cada um dos envolvidos. Assim, o espectador consegue compreender de forma mais exata os sentimentos e as motivações que determinam todas as ações daqueles que estão sendo afetados pela doença de Kate. Fica mais fácil compreender o egoísmo da mãe, a aparente falta de sensibilidade da irmã mais nova com relação à doença da mais velha, a resignação do pai, ou mesmo, os altos e baixos no humor de Kate. “Uma Prova de Amor” é um filme que faz as pessoas refletirem de alguma maneira. Uma lição sobre a dor e sobre como seguir em frente. Deixa claro que sempre vale a pena lutar pela vida, mas a aceitação do destino, às vezes, é a única coisa que nos resta. Por outro lado, para quem assiste restam apenas as lágrimas.


Por Gabriel Von Borell




ficha técnica:
título original:My Sister's Keeper
gênero:Drama
duração:01 hs 49 min
ano de lançamento:2009
site oficial:http://www.mysisterskeepermovie.com
estúdio:Curmudgeon Films / Gran Via Productions / Mark Johnson Productions
distribuidora:Warner Bros. Pictures / PlayArte
direção: Nick Cassavetes
roteiro:Jeremy Leven e Nick Cassavetes, baseado em livro de Jodi Picoult
produção:Stephen Furst, Scott Goldman, Mark Johnson, Chuck Pacheco e Mendel Tropper
música:Aaron Zigman
fotografia:Caleb Deschanel
direção de arte:
figurino:Shay Cunliffe
edição:Jim Flynn e Alan Heim
efeitos especiais:Matte World Digital / Tinsley Transfers

elenco:
Abigail Breslin (Andromeda "Anna" Fitzgerald)
Cameron Diaz (Sara Fitzgerald)
Sofia Vassilieva (Kate Fitzgerald)
Heather Wahlquist (Tia Kelly)
Jason Patric (Brian Fitzgerald)
Evan Ellingson (Jesse Fitzgerald)
Alec Baldwin (Campbell Alexander)
Nicole Marie Lenz (Gloria)
Brennan Bailey (Jesse Fitzgerald - 10 anos)
Olivia Hancock (Kate Fitzgerald - 2 anos)
Jeffrey Markle (Dr. Wayne)
Emily Deschanel (Dra. Farquad)
Noni Tulk-Perna (Ellen)
Matthew Barry (Tio Tommy)
Annie Wood (Esposa do tio Tommy)
Chris Kinkade (Dr. Nguyen)
David Thornton (Dr. Chance)
Frank Cassavetes (Gus)
Joan Cusack (Juíza De Salvo)

terça-feira, 13 de julho de 2010

"Preciosa"

O diretor Lee Daniels traz ao público uma história de força e esperança com “Preciosa” (Precious, 2009). Com um excelente roteiro, baseado no livro “Push” da escritora Sapphire e assinado por Geoffrey Fletcher, o cineasta conta a trajetória de Claireece "Precious" Jones (Gabourey Sidibe), uma adolescente de 16 anos negra, pobre, obesa, analfabeta e que vive no Harlem de Nova York. Pelo eficiente enredo, o filme acabou conquistando o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. Gabourey surpreende em seu primeiro papel no cinema. Sua determinação e entrega em cena lhe valeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz. O filme conta também com duas celebridades da música: Lenny Kravitz interpreta o enfermeiro John e Mariah Carey vive a assistente social sra. Weiss. Os dois se apresentam na tela completamente desprovidos de qualquer glamour e convencem com suas atuações. Na produção executiva, a apresentadora de TV americana Oprah Winfrey ajudou a alavancar a divulgação do filme. A vida de Precious é dura e cruel. Seu nome é uma ironia perversa do destino. Enquanto sonha em encontrar um namorado e viver um romance digno de Hollywood, a garota é vítima dos constantes abusos sexuais do pai. Precious teve sua primeira filha aos 12 anos, fruto desta relação incestuosa e está esperando outra criança do mesmo homem. Não bastasse a violência sexual, a mãe dela, Mary (Mo'Nique), tortura Precious fisica e psicologicamente, não perdendo a oportunidade de tratá-la como lixo. Numa espécie de refúgio, Precious cria seu próprio universo de ilusões, onde sua vida é muito mais interessante que a dura realidade. Em seus devaneios, ela tem a pele clara, é bonita, tem um namorado branco, é atriz de cinema e posa para capas de revista. Mas Precious sempre precisa despertar de seus sonhos e lidar com o mundo real. O destino é impiedosamente injusto com Precious e sua auto-estima é praticamente nula. Na escola, suas notas não são lá muito boas e sua situação complica de vez quando a diretora descobre sua segunda gravidez. Em momento algum a jovem tem coragem de falar sobre os abusos que sofre do pai, então Precious acaba sendo obrigada a mudar para uma escola alternativa para jovens problemáticos. O que ela não sabe é que coisas boas finalmente podem estar por vir e a mudança pode significar o início de sua redenção neste mundo de cão. Esta pode ser uma oportunidade de reescrever a sua história, agora com alegrias ao invés de tristezas, decepções e maus tratos. Quando Precious é mandada para a nova escola, sua professora, a sra. Rain (Paula Patton), passa a exercer um papel fundamental na sua transformação. De início, durante as aulas, Precious se mostra relutante para falar sobre a sua vida sofrida diante da professora e das outras meninas da classe. Mas aos poucos, a sra. Rain vai a convencendo de que existe um caminho que pode ser explorado, lhe mostrando que não é certo Precious viver a margem da sociedade e levar uma vida de invisibilidade. Ela podia, e devia, ser enxergada pelas pessoas a sua volta. Sempre passiva até o momento, Precious começa então a confrontar os seus pais e o mundo. A jovem percebe que o problema não está nela, não é ela. Nem é a sua feiúra, ou a sua cor, ou o seu corpo. Precious percebe que ela é apenas uma vítima das circunstâncias, que pela primeira vez ela está tendo apoio de alguém para entender como deve proceder em meio a tantas dificuldades. A direção de Lee Daniels é segura e muito bem conduzida. O diretor opta por uma câmera na mão e em constante movimentação, potencializando o senso de realismo do longa e deixando os espectadores ainda mais vidrados na trama. Daniels consegue fugir dos clichês do gênero com destreza, mas sem abrir mão da carga emocional que a história requer. Uma das cenas mais interessantes do filme, quando Mary procura se reaproximar de Precious, depois que a última saiu de casa, ilustra bem esta habilidade de Daniels. Em conversa com a assistente social, Precious e Mary tentam colocar os pingos nos “is”. É quando a mãe finalmente abre o jogo sobre o motivo para tanto ódio pela filha. Mary admite que sempre fez vista grossa para a violência sexual que seu namorado submetia a própria filha e em seguida faz uma confissão perturbadora sobre como ela transferiu toda a sua frustração como mulher e mãe para Precious. Mary assume que no fundo enxergava na filha a pessoa que lhe tirou “seu homem” e tornou sua vida miserável. Mo'Nique mostra em cena que seu Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante foi muito merecido. “Preciosa” retrata uma história difícil de ser digerida, não é fácil esquecer tudo aquilo que é jogado na tela. É um choque com uma realidade que não é comum a maioria de nós, mas que está presente a nossa volta. Queiramos enxergar ou não.


Por Gabriel Von Borell




ficha técnica:

título original:Precious: Based on the Novel Push by Sapphire
gênero:Drama
duração:01 hs 50 min
ano de lançamento:2009
site oficial:http://www.weareallprecious.com/
estúdio:Lee Daniels Entertainment / Smokewood Entertainment Group
distribuidora:Lionsgate / PlayArte
direção: Lee Daniels
roteiro:Geoffrey Fletcher, baseado em livro de Sapphire
produção:Lee Daniels, Gary Magness e Sarah Siegel-Magness
música:Mario Grigorov
fotografia:Andrew Dunn
direção de arte:Matteo de Cosmo
figurino:Marina Draghici
edição:Joe Klotz
efeitos especiais:LOOK! Effects


elenco:

Gabourey Sidibe (Claireece "Preciosa" Jonas)
Mo'Nique (Mary)
Rodney Jackson (Carl)
Paula Patton (Sra. Rain)
Mariah Carey (Sra. Weiss)
Sherri Shepherd (Cornrows)
Lenny Kravitz (Enfermeiro John)
Stephanie Andujar (Rita)
Chyna Layne (Rhonda)
Amina Robinson (Jermaine)
Xosha Roquemore (Joann)
Angelic Zambrana (Consuelo)
Aunt Dot (Tootsie)
Nealla Gordon (Sra. Lichtenstein)
Barret Helms (Tom Cruise)
Kimberly Russell (Katherine)
Bill Sage (Sr. Wicher)
Sapphire
Patty Duke