terça-feira, 25 de agosto de 2009

"Maria Antonieta"

As duras críticas recebidas em Cannes não fazem jus à “Maria Antonieta” (Marie Antoinette, 2007) de Sofia Coppola. O terceiro filme da herdeira de Francis Ford Coppola é franco e ousado. O maior erro da crítica talvez resida no fato de não ter compreendido a proposta de Sofia. Muitos condenaram a diretora por ignorar os fatos históricos e políticos presentes na revolução francesa. Sofia concentrou sua história nas particularidades da rainha da França e apenas fez sutis referências à situação política que os franceses viviam naquele momento. E para encarnar a sua Maria Antonieta, a diretora buscou novamente Kirsten Dunst (que também fez “As Virgens Suicidas”). A escolha não poderia ter sido melhor. A atriz está perfeita como a jovem rainha francesa despolitizada e festeira que peca pelos excessos. Kirsten demonstra enorme expressividade facial e em vários momentos expõe os sentimentos de Maria Antonieta sem necessariamente emitir um som. É simplesmente impecável. A fotografia de Lance Acord também é maravilhosa, assim como a direção de arte de Anne Seibel e o figurino de Milena Canonero. Para completar, o espectador é apresentado a uma trilha sonora contemporânea em pleno filme de época, com direito a Strokes e Gang of Four. A opção pela trilha confere ao longa um vigor moderno e jovial, do jeito que Sofia queria. Embora tenha uma narrativa demasiadamente lenta, que já virou marca registrada da diretora, “Maria Antonieta” tem uma atmosfera adolescente. Não à toa, Sofia inseriu uma cena em que um all-star surge na tela em meio aos sapatos caros que a rainha francesa ostentava em seu guarda-roupa. Com apenas 14 anos, a austríaca Maria Antonieta (Kirsten Dunst) é enviada à Paris para se casar com o príncipe Luís XVI (Jason Schwartzman). Logo que chega, a jovem se sente bastante desconfortável em meio às tradições da corte de Versalhes. Porém, não demora muito até Maria Antonieta entrar no jogo da corte e sucumbir aos encantos da vida palaciana. E assim desfrutar de exageros consumistas elevados a uma potência jamais pensada anteriormente. A vida dentro da nobreza é uma frivolidade só e a Maria Antonieta idealizada por Sofia mais parece uma patricinha em Versalhes, o que neste caso não é demérito algum. A fim de afastar o tédio, a jovem rainha leva uma vida farrista e inconseqüente. O filme também mostra o “drama” de sua vida conjugal. Luís XVI demorou sete anos para consumar o casamento. A languidez de seu marido fez com que Maria Antonieta sofresse durante um grande período. A rainha era atormentada pela mãe que se preocupava com uma possível anulação do casamento em função da demora na consumação do matrimônio. Ela também tinha que lidar com as pressões da corte que insinuavam que Maria Antonieta tinha algum problema para gerar um herdeiro. Sofia explorou o tema com bom humor através das tentativas frustradas da rainha em seduzir seu marido. Quanto à situação política, a rainha sempre deixava claro não se importar com o que acontecia fora do Palácio de Versalhes e fechava os olhos para as questões políticas. Quando a fase pré-Revolução Francesa estourou, os parisienses passavam fome e pediam pão ao passo que a corte francesa vivia extravagantemente. Algumas referências históricas afirmam que a rainha teria dito: “Se eles não têm pão, que comam brioches”. Sofia Coppola, em seu filme, trata de absolvê-la quando Maria Antonieta diz: “Imaginem se eu ia dizer uma idiotice dessas”. Fato é que os caprichos cometidos pela rainha francesa ao longo de sua vida em Versalhes causaram uma impopularidade gigantesca. A figura de Maria Antonieta não era vista com bons olhos pelo povo francês. Mas a rainha não se escondeu quando a revolta dos franceses foi iniciada e se recusou a fugir ou se esconder. Maria Antonieta se manteve sempre ao lado do marido e preferira a morte na guilhotina à fuga. E é de maneira brilhante, e grande sutileza, que Sofia Coppola anuncia o trágico fim da sua personagem. Em silêncio, a última cena ilustra o declínio da monarquia francesa através de uma simples imagem. “Maria Antonieta” é um filme um pouco diferente dos longas de época que costumamos ver. Diferente para melhor. Mas só aqueles que entenderem a proposta de Sofia saberão apreciar da forma devida.


Por Gabriel Von Borell




Ficha Técnica
Título Original: Marie Antoinette
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 123 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Japão / França): 2007
Site Oficial: www.marieantoinette-movie.com
Estúdio: Columbia Pictures Corporation / American Zoetrope
Distribuição: Columbia Pictures / Sony Pictures Entertainment
Direção: Sofia Coppola
Roteiro: Sofia Coppola
Produção: Sofia Coppola e Ross Katz
Música: Jean-Benoît Dunckel e Nicolas Godin
Fotografia: Lance Acord
Desenho de Produção: K.K. Barrett
Direção de Arte: Anne Seibel
Figurino: Milena Canonero
Edição: Sarah Flack
Efeitos Especiais: L'Etude et la Supervision des Trucages


Elenco
Kirsten Dunst (Maria Antonieta)
Marianne Faithfull (Maria Teresa)
Steve Coogan (Embaixador Mercy)
Judy Davis (Condessa de Noailles)
Jason Schwartzman (Rei Luís XVI)
Rose Byrne (Duquesa de Polignac)
Al Weaver (Conde d'Artois)
Shirley Henderson (Tia Sophie)
Molly Shannon (Tia Victoire)
Rip Torn (Luís XV)
Jean-Christophe Bouvet (Duque de Choiseul)
André Oumansky (Cardeal de la Roche)
Asia Argento (Madame du Barry)
Guillaume Gallienne (Vergennes)
Aurore Clément (Duquesa de Char)
Jean-Paul Scarpitta (Barão Scarpitta)
Lucien Rolland (Arcebispo de Reims)
Mary Nighty (Princesa Lamballe)
Clementine Poidatz (Condessa de Provence)
Clara Braiman

terça-feira, 11 de agosto de 2009

"Queime Depois de Ler"

Depois de atingir a consagração mundial com “Onde os Fracos Não Tem Vez” (No Country for Old Men, 2007), os irmãos Ethan e Joel Coen retornam às suas origens e realizam uma comédia recheada de humor negro, acidez, ironia e violência. “Queime Depois de Ler” (Burn After Reading, 2008) é uma grande sátira dos filmes de espionagem e coloca galãs de Hollywood como Brad Pitt e George Clooney em papéis ridículos fazendo o espectador rir de situações esdrúxulas. E, até mesmo, rir de si mesmo através de um processo de identificação com as situações bizarras vivenciadas pelos diferentes personagens. O longa dos irmãos Coen é extremamente sarcástico e tira sarro da moralidade fajuta e hipocrisia que impregna a sociedade americana. O elenco inspirado e numa sintonia perfeita garante boas gargalhadas e divertimento de qualidade. A química entre os atores é tão boa que não dá pra saber quem está melhor em cena. “Queime Depois de Ler” é acima de tudo um filme para não ser levado muito a sério. A trama começa quando o agente da CIA, Osbourne Cox (John Malkovich), é demitido da sua unidade por causa de seu “problema com bebida”. Irado, Cox não aceita o cargo burocrático em outro setor que lhe é oferecido e se desliga da CIA. Disposto a se vingar, o agora ex-agente resolve escrever um livro com as suas memórias e assim fazer revelações que podem comprometer a Agência de Inteligência norte-americana. Quando Cox conta à sua esposa Katie (Tilda Swinton) sobre seus novos planos, ela finalmente resolve se divorciar do marido para ficar com o segurança do governo Harry Pfarrer (George Clooney), um sujeito canastrão que se gaba de nunca ter precisado disparar um tiro em 20 anos de profissão. Com a intenção de analisar todo o patrimônio de Cox antes de entrar com o pedido de divórcio, Katie rouba arquivos do computador pessoal do ex-agente para que seu advogado avalie o material durante a separação. Porém, acidentalmente, o CD cai nas mãos de dois funcionários de uma academia de ginástica no subúrbio. Julgando se tratar de arquivos confidenciais e importantíssimos da CIA, Linda Litzke (Francis McDormand) encara o CD como a oportunidade perfeita para finalmente conseguir fazer as cirurgias plásticas que tanto deseja, mas que até agora não foi possível por questões financeiras. Linda elabora um plano para chantagear Cox junto com ajuda do instrutor de ginástica Chad Feldheimer (Brad Pitt). Neste momento se inicia um processo de paranóia coletiva e conspiração sobre absolutamente nada. Os personagens começam a se cruzar de diferentes e tortuosas maneiras, contribuindo para uma confusão ainda maior. “Queime Depois de Ler” brinca com o fato do quão ridículo e idiota podem ser os seres humanos e ironiza o tempo todo os estereótipos que estão presentes ao nosso redor. E deixa claro que o importante é não perder o bom humor, mesmo diante de tantas bizarrices.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: Burn After Reading
Gênero: Comédia
Tempo de Duração: 96 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Inglaterra / França): 2008
Site Oficial: www.burnafterreading.com
Estúdio: Working Title Films / Studio Canal / Relativity Media / Mike Zoss Productions
Distribuição: Focus Features / Paramount Pictures / UIP
Direção: Joel Coen e Ethan Coen
Roteiro: Joel Coen e Ethan Coen
Produção: Tim Bevan, Ethan Coen, Joel Coen e Eric Fellner
Música: Carter Burwell
Fotografia: Emmanuel Lubezki
Desenho de Produção: Jess Gonchor
Direção de Arte: David Swayze
Figurino: Mary Zophres
Edição: Joel Coen e Ethan Coen
Efeitos Especiais: Brainstorm Digital / Big Film Design


Elenco
George Clooney (Harry Pfarrer)
Frances McDormand (Linda Litzke)
John Malkovich (Osbourne Cox)
Tilda Swinton (Katie Cox)
Brad Pitt (Chad Feldheimer)
Richard Jenkins (Ted Treffon)
Elizabeth Marvel (Sandy Pfarrer)
Olek Krupa (Krapotkin)
Michael Countryman (Alan)
Hamilton Clancy (Peck)
Armand Schultz (Olson)
Brian O'Neill (Hal)
David Rasche (Oficial da CIA)
J.K. Simmons (Superior da CIA)
Dermott Mulroney (Astro de "Coming Up Baby")

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

"O Menino do Pijama Listrado"

Adaptação do famoso livro de John Boyne, “O Menino do Pijama Listrado” (The Boy in the Striped Pyjamas, 2008), dirigido pelo inglês Mark Herman, é um filme emotivo e impactante. O longa narra uma história sobre o nazismo e suas atrocidades a partir de uma perspectiva diferente das quais estamos habituados. O conflito entre alemães e judeus aqui é retratado sob a ótica ingênua de duas crianças. Um enorme contraste. De um lado está o filho de um militar alemão desfrutando de todas as mordomias que o sistema lhe proporciona. De outro está um menino judeu de dentes apodrecidos e com fome preso num campo de concentração. Apesar de pertencerem a universos tão distantes, apenas uma grade elétrica separa os dois garotos. A maior sacada do diretor reside no fato de deixar de lado as crueldades do regime nazista, ciente de que o espectador já sabe de tudo que aconteceu naquele período, e se concentrar na amizade que é construída pelas duas crianças. Herman apenas sugere as atrocidades através de suas imagens. Como, por exemplo, quando aparecem as chaminés do campo de concentração soltando uma forte fumaça e o público entende o horror por trás daquela nuvem negra no céu. Com muito bom gosto e sem apelações, o cineasta toca o espectador ao mostrar a inocência em meio a uma guerra. Sem se dar conta da destruição que acontece ao seu redor, as crianças se mostram completamente alheias ao ódio disseminado por suas origens e imersas em seus próprios universos. E o talento dos dois protagonistas é parte fundamental da história. Os meninos Asa butterfield e Jack Scanlon estão perfeitos em seus papéis. Assim como Vera Farmiga, que interpreta a mãe do garoto alemão. Bruno (Asa Butterfield) é um menino de oito anos que, filho de um oficial nazista, se vê obrigado a mudar de vizinhança e abandonar seus amigos. Seu pai (David Thewlis) administrará o campo de concentração de Auschwitz e Bruno não fica nada contente de ter de se mudar para o interior. Logicamente, o menino não sabe da atividade do pai e pensa que as pessoas que vivem próximas à sua nova casa são apenas “fazendeiros”. Entediado pela falta de companhia, Bruno decide explorar as imediações do lugar e acaba descobrindo o campo de concentração que seu pai coordena. Lá, ele conhece Schmuel, um garoto da sua idade que foi enviado ao campo e nem mesmo sabe o porquê. Separados por uma cerca eletrificada, Bruno logo indaga sobre o número presente na camiseta de Schmuel e sobre seu “pijama listrado” (uniforme que todos os judeus eram obrigados a usar dentro do campo de concentração). Mas é óbvio que Schmuel não sabe explicar sobre isto e apenas explica que todos devem usar o tal “pijama” e todos também carregam números. Quando chega a vez de Schmuel perguntar sobre a vida de Bruno a primeira dúvida do menino é se existe comida onde Bruno mora. A partir daí, vai se construindo uma forte amizade entre os dois e todos os dias os garotos se encontram naquele mesmo local. Enquanto isso, a mãe de Bruno (Vera Farmiga), aos poucos, percebe a participação de seu marido nos absurdos cometidos pelo regime nazista. A moça passa a sofrer conforme vai notando que se casara com um homem que não era bem aquilo que ela pensava ser. Tentando proteger seus filhos de toda aquela monstruosidade, ela é obrigada a ver sua filha mais velha, Gretel (Amber Beattie), ser doutrinada por um professor nazista responsável pelo ensino particular das crianças. Ele realiza uma verdadeira lavagem cerebral na garota e deixa sua mãe cada vez mais assustada com a situação na Alemanha. Bruno acaba não sendo afetado já que na maioria das vezes não entende as idéias de seu professor. Quando seu pai resolve colocar sua família novamente de mudança, em função dos problemas que o nazismo traz para o seu casamento, Bruno não aceita a novidade por causa da amizade que construiu com Schmuel. Ao contar a má notícia a Schmuel, o garoto judeu diz que seu pai está desaparecido e Bruno resolve ajudar a encontrá-lo. Para isto, eles planejam um modo de colocar Bruno dentro do campo de concentração sem levantar suspeitas. Schmuel arranja um uniforme para o amigo e Bruno leva uma pá até o campo para cavar um buraco e assim poder passar por debaixo da cerca. Só que esta atitude dos garotos trará conseqüências terríveis. Uma triste e cruel ironia do destino se anuncia. E “O Menino do Pijama Listrado” chega ao seu clímax chocando até mesmo o mais insensível dos espectadores que, conduzido pela excelente trilha sonora de James Horner, mal pode acreditar no desfecho que acabou de assistir.


Por Gabriel Von Borell



Ficha Técnica
Título Original: The Boy in the Stripped Pyjamas
Gênero: Drama
Tempo de Duração: 94 minutos
Ano de Lançamento (EUA / Inglaterra): 2008
Site Oficial: www.boyinthestripedpajamas.com
Estúdio: BBC Films / Miramax Films / Heyday Films
Distribuição: Miramax Films / Buena Vista International
Direção: Mark Herman
Roteiro: Mark Herman, baseado em livro de John Boyne
Produção: David Heyman
Música: James Horner
Fotografia: Benoît Delhomme
Desenho de Produção: Martin Childs
Direção de Arte: Mónica Esztán, Rod McLean, Razvan Radu e Szilvia Ritter
Figurino: Natalie Ward
Edição: Michael Ellis


Elenco
Asa Butterfield (Bruno)
Zac Mattoon O'Brien (Leon)
Domonkos Németh (Martin)
Henry Kingsmill (Karl)
Vera Farmiga (Mãe)
David Thewlis (Pai)
Cara Horgan (Maria)
Amber Beattie (Gretel)
László Áron (Lars)
Béla Fesztbaum (Schultz)
Attila Egyed (Heinz)
Rupert Friend (Tenente Kotler)
David Hayman (Pavel)
Jack Scanlon (Schmuel)
László Nádasi (Isaak)